segunda-feira, 4 de outubro de 2010

POIS É, PRA QUÊ?

Porque é uma palavra que tem quatro formas de grafia, quatro tormentos, remetendo a perguntas e respostas, motivos e explicações. Não precisava tanto, creio. Por mim uma bastaria para o saudável exercício de comunicar, de aprender e ensinar.

Tem horas que a gente fica escarafunchando umas coisas que nem sei o porquê. Vamos acumulando aprendizados na vida, vamos exercitando o ato de pensar, vamos dando corda às lembranças guardadas de coisas que vimos ou ouvimos há tanto tempo. Por causa de quê?

Tem gente mais pragmática no sentido de não querer aprender muitas coisas que lhes são consideradas inúteis para o seu viver. Preferem às vezes acumular coisas, digamos, mais palpáveis do que o ato de aprender com perguntas e respostas. Estas quase nunca satisfazem plenamente porque não dá para “pegar”, gerando sempre mais perguntas, o que dá uma canseira danada.

Igualzinho com as coisas palpáveis. Compra-se um objeto do desejo (não da necessidade). Aquilo satisfaz por um momento, vem a publicidade dizendo que agora o que você precisa é de outra coisa, e, havendo dinheiro, vai-se comprando mais coisas até saciar a vontade plenamente ou acabarem os estoques. Dura pouco essa satisfação. A do aprendizado traz mais benefícios a meu ver.

 Faz sentido eu saber como se fixa uma peça em outra, apertando um parafuso ou encaixando duas peças? Faz sentido um biólogo saber trocar um pneu de um carro? Faz sentido uma dona de casa saber de assuntos que estão totalmente fora da moda da novela, como, por exemplo, de filosofia? Por que um atleta vai saber dos casos de corrupção na política? Vale a pena pensar sobre religião? Um executivo precisa saber algo sobre culinária, se o seu negócio é o mercado financeiro? Para que serve o conhecimento da história? Um inútil saber do pós-fato? E quando vem aquela situação na vida prática em que é necessária uma resposta do tipo: o que você faria?

O conhecimento, ao contrário de bugigangas não ocupa lugar nem incomoda ou traz drama existencial sem por quê.

POIS É, PRA QUÊ?
Sidney Muller

O automóvel corre
A lembrança morre
O suor escorre
E molha a calçada
A verdade na rua
A verdade no povo
A mulher toda nua
Mas nada de novo
A revolta latente
Que ninguém vê
E nem sabe se sente
Pois é, pra que?

O imposto, a conta
O bazar barato
O relógio aponta
O momento exato
Da morte incerta
A gravata enforca
O sapato aperta
O país exporta
E na minha porta
Ninguém quer ver
Uma sombra morta
Pois é, pra que?

Que rapaz é esse?
Que estranho canto
Seu rosto é santo
Seu canto é tudo
Saiu do nada
Da dor fingida
Desceu a estrada
Subiu na vida
A menina aflita
Ele não quer ver
A guitarra excita
Pois é, pra que?

A fome, a doença
O esporte, a gincana
A praia compensa
O trabalho a semana
O chopp, o cinema
O amor que atenua
Um tiro no peito
O sangue na rua
A fome, a doença
Não sei mais porque
Que noite, que lua
Meu bem, pra que?

O patrão sustenta
O café, o almoço
O jornal comenta
Um rapaz tão moço
O calor aumenta
A família cresce
O cientista inventa
Uma flor que parece
A razão mais segura
Pra ninguém saber
De outra flor
Que tortura...

No fim do mundo
Tem um tesouro
Quem for primeiro
Carrega o ouro
A vida passa no meu cigarro
Quem tem mais pressa
Que arranje um carro
Pra andar ligeiro
Sem ter porque
Sem ter pra onde
Pois é, pra que?
Pois é, pra que?
Pois é!

11 comentários:

lisa disse...

Uau, crônica e poesia perfeitas.

Sabe, meu caro, as vezes penso que algumas pessoas esquecem de exercitar o ato de pensar simplesmente porque as idéias ainda não são moeda de troca em um mundo que aceita idéias prontas.
Um homem vai ao mercado e faz suas compras, na hora de pagar, olha para o caixa e diz "E ai posso pagar com uma idéia, estou sem dinheiro hoje? "


Um abração

pensandoemfamilia disse...

Vc hoje foi longe no seu filosofar.
Como é importante todos os saberes, somamos conhecimentos de todas as esfera e mesmo sem prestar tanta atenção, estamos lançando mão para tecermos os fios das nossas idéias.

bjs

Isadora disse...

Cacá, acho importante o saber... mas é claro que algumas coisas aprendidas ao lobngo da vida serão esquecidas e outras lembradas sempre. Acho que o melhor são as possibilidades que surgem quando você se depara com determinado assunto. Pode pesquisar e entender mais ou apenas deixá-lo de lado.
Um beijo

chica disse...

Poesia linda e tua crônica a introduzindo foi linda!

abração,ótima semana,chica( não vens ao RS no encontro do RL?)

Zélia Guardiano disse...

Cacá, meu querido amigo
Tua magnífica crõnica e o poema: corda e caçamba!
Nunca vi algo tão perfeitamente introsado.
Maravilha de postagem!
Estou aqui e aqui ficarei, por muito tempo, refletindo sobre tudo que li, pois tenho diante de mim, matéria para profunda reflexâo...
Até porque tenho pensado sobre a inutilidade de querer saber mais( tenho vontade de aprender umas coisas...), nesta altura da vida.
Tive uma tia (irmã de minha mãe)que era analfabeta e felicíssima!
Ela sabia fazer duas coisas: capinar com sua gasta enxada e assar umas broinhas de fubá deliciosas... E bastava...
Hi, amigo, ando muito pensativa, muito cheia de questionamentos...
Punto e basta! rsrs...
Grande abraço!

Toninho disse...

Pois é seu Zé! Por que? O Sidney Muller feliz nesta composição explora esta busca que fazemos como se não direcionasse ao nada. Já voce com toda inteligencia fez uma linda varredura, do que buscamos e desprezamos,mas deixando claro nas entrelinhas que o saber é servivel em alguma situação, no que penso ter sido feliz na proposição. Mas confesso que a pior é esta o que voce faria, porque parece nos deixar nu.Enfim um belo texto reflexivo, com bela ilustração musical dos anos duros da Redentora(sic). Meu abraço amigo por mais esta bela postagem,que faz olhar pra dentro.

Ester disse...

Cacá, com suas crônicas sempre certeiras e pontuais!
O mundo de Cacá também é cultura, rs

É sempre muito bom vir, embora venha muito menos do que gostaria devido ao número grande de blogues a serem visitados,
aqui há sempre algo novo e criativo que me atrai..

Abraços poéticos para vc!

boutique de ideias disse...

É queridao, se tem algo que a gente leva desse mundo é o conhecimento, o resto, bens materiais, deixamos tudo... Mas a sabedoria é só nossa e só podemos dividi-la, enquanto vivos, bem vivos!!!!!!!

Ficou maravilhosa a cronica, Cacá!! Beijo grande!!!!!

Tati disse...

Oi Cacá! Sabe que esta dúvida ainda me assola? Nem sempre sei qual porque usar. Acento? Não acento? Junto, separado? Mas porquês estão sempre em mim, e não tem resposta que me baste... Então, a resposta que te dou, à pergunta que não fez é: Estou de volta!! hehehhe
Agora não quero mais partir, nunca mais! Adorei os questionamentos, será que alguém é mesmo capaz de achar que saberes não lhes farão falta? São, né,? ai, ai...
Beijos.

Neca disse...

Meu avô tinha mania de guardar todo tipo de tranqueira que encontrasse pelo caminho. Dizia ele, que um dia alguma daquelas bugigangas poderia lhe ser útil...Então, não custava guardar.

Talvez o conhecimento (lato sensu) seja assim. A gente vai acumulando dados que, talvez, possam nos ser úteis lá na frente. Se não forem, um dia a gente faz uma faxina e joga tudo fora. Sem remorso.

Beijin

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