segunda-feira, 31 de maio de 2010

APOSENTADORIA

O PROBLEMA ETERNO DA PREVIDÊNCIA

Para quem já se aposentou ou pensa em algum dia se aposentar: entre os muitos problemas da nossa previdência, o que me chama mais atenção quanto ao descaso com aposentados no Brasil é o seguinte:

a) As leis previdenciárias são feitas e aprovadas por quem tem uma aposentadoria que não é paga com o dinheiro da previdência (regime geral) São os deputados e senadores. E não é pouco.

b) Essas mesmas leis quando são questionadas, são julgadas por pessoas que têm seu sistema próprio de aposentadoria e que também é invejável, os juizes.

c) E para executá-las, os funcionários que comandam o sistema também não são aposentados pelo regime geral da previdência. (os próprios funcionários públicos graduados do INSS) E se aposentam com salários gordos.

Dá para confiar que pode vir a mudar alguma coisa em favor dos aposentados e aposentáveis?
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VERSOS PERMANENTES DO SEGURADO

Está chegando o fim do mês,
meu senhor, minha senhora.
Será a minha, a sua, a nossa vez,
de saber quem mais demora,
a gastar o benefício,
que mais parece uma esmola.
Quem a vida inteira, no sacrifício,
ralou, suou e fez escola,
aprendendo e ensinando ofício,
ajudando a coletividade a andar,
chega a se aposentar,
mas não é recompensado.
É antes, responsabilizado
pela falência de um sistema
que a gente mesmo é dono.
Porém falcatruas, descontrole e fraudes
Isso é um velho problema
E acontece sem o nosso abono,
na nossa cara e aos baldes.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

VERSINHO DA DOR DE COTOVELO *

Expressão maior de maldade,


Vou lhe dizer a verdade


É quando um amor tão querido


Se faz de bandido


Nos deixando apenas a queixa


Dá saudade como efeito


E uma dor que não deixa


Parar de arder o peito.


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* A expressão teve origem nas cenas de pessoas sentadas em bares, com os cotovelos apoiados no balcão bebendo e chorando um amor perdido. Muitos atribuem a criação da expressão ao genial compositor Lupicínio Rodrigues.

Então, de tanto ficar naquela posição, as pessoas ficavam com dores no cotovelo. Atualmente, é muito comum utilizar essa expressão para designar o despeito provocado pelo ciúme ou a tristeza causada por uma decepção amorosa.

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Fonte:
http://www.brasilescola.com/curiosidades

quinta-feira, 27 de maio de 2010

ACRÓSTICO DO A até o Z

Aqui começa a brincadeira
Bem ao gosto de quem lê
Curta letras e palavras
Depois mande tudo às favas
Entre risos e raivas
Faça o que bem entender
Gostando, vai querer guardar
Hediondo sendo considerado
Ignorar é o melhor a se fazer
Junte alegria e enfado, jovialidade e siso.
Kkkkk! Venceu a vontade do riso
Loucura estamos fazendo
Mais eu do que você que está lendo
Nada aqui faz sentido
Ou faz, querida amiga, amigo querido?
Pior que isso eu já vi
Quando eu mesmo invento moda
Rabisco papel, digito tolices
Sai cada coisa que é... fogo!
Termino aqui o meu teste
Um acinte à paciência
Vir aqui me ler contente
Xingue agora, sem clemência
Yes I can, sim eu posso
www quer dizer que o mundo não é só meu, tá vendo? É nosso
Zzzzzz! Dormi primeiro. Obrigado, minha gente!

quarta-feira, 26 de maio de 2010

UM PAI EM TODAS AS COPAS

PAI,

Era para falar de copas do mundo. Você está acompanhando essa modalidade desde a primeira, em 1930. Era o seu primeiro ano de vida. Mas entre uma copa e outra, quantas histórias vividas, quanta coisa aconteceu nesse mundão nos últimos 81 anos. A saúde que lhe acompanha desde 1929 não é algo que deva ser levado apenas como natural. A começar que naquele ano, o mundo experimentava uma das maiores crises econômicas de sua história. Faltavam inclusive, gêneros alimentícios porque uma especulação financeira de proporções gigantescas derrubou os montes de dinheiro que circulavam no mundo, então muito menos habitado, e que deixou alguns ricos pobres e os milhões de pobres, miseráveis. No Brasil, o abalo foi ainda maior. Uma economia que dependia quase que exclusivamente de um produto, este que lhe ofereço hoje para tomar de manhã e que alguns de seus filhos até o plantam atualmente. O café movia o Brasil e o deixou imóvel e faminto. Ele não faltava, pelo contrário. Havia em abundância sem que ninguém se interessasse em comprar.

Veio a seguir uma rigorosa ditadura, o chamado Estado Novo, capitaneado por Vargas, suprimindo liberdades, sufocando o povo. E logo depois uma guerra mundial. Já era a segunda da história. Ainda bem que o senhor era apenas uma criança, um quase adolescente. Uns aninhos a mais e talvez tivesse ido engrossar as fileiras da Força Aérea ou da Força Expedicionária Brasileira que foram combater na Europa, aliados de última hora dos americanos, soviéticos, franceses e ingleses. Nesse intervalo, o mundo ficou sem milhões de vidas e sem duas copas do mundo. Passada a carnificina humana, caiu também a ditadura e o país parecia encaminhar-se para uma normalidade. Nesse meio tempo, você já rapazinho, entrava na Vale do Rio Doce, naqueles tempos onde a tecnologia maior ainda era o lombo do burro e os pequenos caminhões que transportavam para o trem de ferro e os navios, o rico minério de Itabira para ir para o mundo. Um pouco dele ajudou a fabricar não somente os carros da nascente indústria de automóveis e estruturas de aço nas cidades, mas também tanques e armas de guerra. Entrou a década de 50 com o Brasil sediando a segunda copa depois do período de interrupção. Inaugurava-se o Maracanã, então o maior estádio de futebol do mundo. Porém o Brasil não correspondeu ao investimento absurdo na sua construção com a alegria para o povo. Ouvia pelo rádio entre lágrimas que hoje a tv nos mostra, a seleção sucumbir diante de mais de 100 mil pessoas ao Uruguai., lembra-se? Por outro lado, Getulio Vargas que havia sido deposto ao final da guerra, voltava eleito pelo voto direto e nos braços do povo se redimia da sua condição de ditador mas não deixaria de enfrentar os seus antigos detratores nem o poder econômico ancorado no capital internacional. Suicidava-se logo depois de outra copa do mundo em que o Brasil também havia passado do em brancas nuvens.

Você, no entanto, estava em outras nuvens. A essa altura, já havia a Maria Delfina em sua vida, aquela gloriosa mulher que o acompanharia por mais de trinta anos, gerando uma significativa prole, seus nove filhos que aqui estão. A nossa mãe merece um capítulo à parte e muito generoso por sinal. Não foi muita sombra e água fresca o que vocês tiveram que passar para educar essa turma toda. Estamos muito bem, obrigado mesmo!

Em 58 já deu para você sentir uma alegria como torcedor. Pelé, o menino prodígio da bola encantava o mundo e ajudava o Brasil a trazer o seu primeiro caneco. Junto com as seleções de 1970 e 1982, talvez tenham representado o que de melhor já se produziu no futebol para quem aprecia a arte sem paixões cegas. Apenas o jogar bonito. Não sei se você vê da mesma forma. Aqui já é uma opinião deste filho que lhe escreve. Eu já era um garoto em 70 e em 82 já era um homem feito. A de 58 eu não me canso de ver quando reprisam nos canais de televisão. Ainda ao final da década de 50, veio o que talvez possa ser chamado de milagre econômico no Brasil. Não digo em termos de uma isonomia nas riquezas produzidas, que isso não é coisa que o capitalismo proporcione em lugar nenhum do mundo, mas de uma nova fisionomia que o país ganhou, com a chegada massiva de indústrias de bens de consumo e da construção de Brasília para ser a capital Federal. São os anos JK. Nesse meio tempo, há uma consolidação de uma classe operária pujante e você estava lá, imbuído de princípios de igualdades envolvido com o movimento sindical urbano em crescimento. Em 62 nascia este que lhe dedica estas linhas e o Brasil havia faturado o seu segundo troféu.

Veio 1964 e um pesadelo passou a povoar os sonhos de liberdade. Alegavam que era um combate a um misterioso fantasma comunista que rondava o mundo e, no entanto mergulharam o país numa das mais terríveis páginas de nossa história. Uma verdadeira guerra civil urbana e rural, com torturas, mortes, perseguições de toda sorte e a liberdade se limitava apenas ao direito de trabalhar e pensar, desde que fosse calado. Falar não podia. Manifestar-se publicamente, nesse caso, nem pensar. Você é testemunha quase física dessa perseguição. Digo quase, pois não chegou a freqüentar os porões dos paus de arara e choques elétricos, ainda assim teve seu mandato sindical cassado, seu contrato de trabalho rompido e sua família sob ameaça constante Safou-se por muito pouco. Foi em plena copa de 70. A gente era muito criança e adolescentes ainda e comemorava sem saber que os “noventa milhões em ação, pra frente Brasil” era só um slogan para encobrir o sangue que corria nos bastidores das vidas de tantas pessoas que ousaram discordar da ditadura militar. A sua prole já estava toda crescendo nessa época, felizes e alheios às dificuldades. Tivemos apesar de tudo, uma infância muito feliz. O ideal de felicidade não estava tão necessariamente associado ao conforto e excesso de acumulo patrimonial e de estrelato e brilho individual como nos dias atuais. Os afazeres coletivos, as possibilidades de viver sem medos nas ruas, a necessidade de inventar, de criar as próprias brincadeiras nos permitiam um maior convívio humano e acho que nos satisfaziam mais ao espírito do que hoje, quando parece que só se consegue uma felicidade depois que passamos no caixa de algum estabelecimento.

Ficamos num jejum de mais de vinte anos sem saborear um título mundial e quanta coisa aconteceu nesse período em sua vida! Os filhos começavam a ter seus próprios trabalhos, suas rendas para diminuir o seu penoso esforço e da nossa mãe de garantirem dinheiro para fazer frente a tanta demanda de alimentos, escolas, roupas, calçados, médicos, dentistas e outras coisas que os pais dão aos filhos. Os primeiros foram saindo de casa e puxando a fila dos outros em busca de seus sonhos, estudando e trabalhando. Começaram em meados da década de 70 a se casarem algumas filhas, outros se formando em alguma coisas.

Entra a década de 80 com o nosso primeiro - e creio convicto -, maior baque humano. Mais do que qualquer fome, mais do que qualquer angústia existencial, mais do que qualquer dificuldade material. A perda de nossa mãe, tão jovem ainda, apenas 51 anos, nos deixando meio acéfalos, meio desnorteados, meio sem chão. Ela tinha uma presença tão importante para todos nós que ainda hoje, após tantos anos de sua partida não conseguimos esquecer o seu significado, o seu aprendizado, a sua sabedoria possível. Falo por mim, mas pelo muito que conheço de meus irmãos todos, não acredito estar exagerando se disser que falo por eles também.

Você nesse intervalo, além de aposentar-se em 82, nunca deixou a sua militância. Não era mais um sindicalista apenas, pelo contrário, expandiu a sua ação para toda a comunidade. Não lutava para melhorar as condições de vida apenas de seus companheiros de mesmo uniforme. Estava numa luta de toda a comunidade Itabirana, como permanece ainda hoje emprestando toda a sua experiência, toda a sua habilidade diplomática e todo o seu carisma para construir uma cidade que dê dignidade no dia a dia de seus habitantes. Assistimos em 94 e 2002 o Brasil ser tetra e penta campeão com esse futebol de resultados e egos muito mais do que arte como era antigamente. Mas de resultados é que mais se fala atualmente. Então estamos aí, a espera do hexa, do hepta... E à espera também de dias melhores para toda a maioria da sofrida e manobrada população brasileira.

Queremos e o senhor também, claro, muito mais do que títulos de copas do mundo. Títulos mais importantes seriam os que laureassem a sua luta em prol de educação, saúde, moradia, saneamento e lazer. Isto sim nos fará um povo mais orgulhoso de ser campeão do mundo em dignidade. A vida segue. . A sua dignidade segue, cada vez mais elevada; seus calos nas mãos e suas rugas cada vez mais respeitados. Temos muito orgulho de poder dizer a quem quer que seja que somos filhos de José Felipe Adão.

Parabéns, PAI.

Aceite esse singelo cafezinho virtual, mas não se sinta liberado da bagunça física. Sábado próximo estaremos toda a família aí, filhos, filhas, genros, noras, netos, bisnetos, sobrinhos, agregados e amigos reunidos para comemorar muito.

terça-feira, 25 de maio de 2010

SIGLAS

Peguei meu CPF e fui à SRF resolver pendências do IR. Caí na malha fina e fui convocado. Peguei o 2212B, a linha do meu bairro que passa lá perto.. Minha senha de atendimento foi 32 AD. Fui falar com o chefe da seção, que me pediu os comprovantes dos rendimentos que declarei, bem como das despesas pagas. Saí de lá e passei no INSS, pois o mesmo não mandou o meu extrato de benefícios (CR). Lá eu sou a matrícula KAV 9196, um beneficiário qualquer. Antes, no entanto, tive que solicitar uma informação a um vigilante cujo crachá não traz o seu nome, apenas Colaborador da SEGUR. Depois passei na CEMIG, a concessionária de energia do estado para obter uma segunda via de CR, que já quer dizer comprovante de residência e não de rendimentos como na previdência. Nessa não me exigiram CPF, mas solicitaram meu RG e o identificador da minha casa. É um código numérico por onde me mandam luz não importando quem eu sou; sou aquele identificador, desde que não atrase o pagamento. Nesse último caso passarei a ter nome. Ou será que me cobrarão a dívida através do meu CPF e no SPC?



E tem gente que diz que a gente não tem boa memória. Já notou a quantidade de siglas e números que somos? Não falei de umas dezoito senhas que possuo para internet de, acesso a páginas onde sou cadastrado, bancárias, números dos telefones fixo e celular, os números do manequim e calçado (embora muita gente por vaidade gostasse de esquecer). Sem contar o outro lado que não tem siglas mas é tudo impessoal do mesmo jeito. Há lugares e situações em que somos contribuintes, consumidores, usuários, beneficiários, devedores, réus, vítimas, transeuntes, passageiros, portadores, cidadãos ufa! Isso é fruto do hábito da redução simplificadora que reina no meio da civilização ou é o desmerecimento com o ser humano? Não importa, não é? Provavelmente os mais reducionistas vão dizer que isso é chatice de um cronista e se perguntarem qual dirão: acho que é um tal de JCA.



E na minha lápide provavelmente estará uma placa assim:

J.C.A

(viveu um pouco no século XX e o resto no XXI)

Baixado no cartório civil sob o nº ....

No de títulos e protestos sob o nº...

segunda-feira, 24 de maio de 2010

LINGUAGENS

Durante um tempo eu morei no centro da cidade. Belo Horizonte oferece aluguéis baratos na região central por possuir prédios sem garagens e apartamentos pequenos. Coisas para gente só ou sem muito dinheiro. Essa última qualidade acaba atraindo muitos estudantes que vêm para capital formar as famigeradas repúblicas estudantis. Ali, ninguém é só, mas quase sempre gente de pouco dinheiro. Tudo fica mais em conta, exceto o ruído e o tumulto. Também, nem tudo é perfeito, não é mesmo?

Na época em que os cinemas ainda não eram igrejas e nem nos shoppings, eu morava bem próximo ao cine Palladium, um cinema mais voltado para filmes de bang-bang e erotismos vulgares. Durante o dia, o seu hall era repleto de pessoas de uma comunidade: os surdos-mudos, que ali se comunicavam freneticamente, numa agitação parecida com uma feira de aflitos. E muita gente ia para lá aprender ou para ensinar a linguagem de sinais. Eu era um desses aprendizes. Quando não tinha o que fazer, ficava ali observando e tentando estabelecer um diálogo de surdos. Aprendi um pouquinho, muito pouquinho. Não havia assiduidade de minha parte.



Se tivesse aprendido tudo, pode ser que eu não ficasse hoje imaginando coisas que talvez tenham sido, talvez não. Por exemplo: outro dia eu estava parado à porta de um restaurante lá perto da escola de minha filha esperando por ela. Chegou um mudo e abriu a mão em minha direção e nela havia duas moedas. Acho que ele queria mais. O gesto que ele fez, eu entendi que era para inteirar o dinheiro para que pudesse almoçar. Eu respondi que não tinha. Fiz um gesto dizendo que eu poderia lhe pagar um almoço com o cartão. Não sei se não me fiz entender ou ele não tinha a intenção de almoçar naquele lugar. Aí a minha dúvida já aumentou. Nem sabia mais se o dinheiro era para o almoço. E gestos para lá, gestos para cá, ele abanava o dedo negativamente e me fazia aqueles movimentos de halterofilista quando se prepara para levantar um peso e a comunicação não se estabeleceu. Notei que ele ficou me olhando de cima abaixo enquanto fazia seus sinais e com um risinho meio irônico de canto de boca. Depois fomos cada um pro seu lado. E eu saí cabreiro e aborrecido quando fui resolvendo o enigma (suponho): e entendi bem depois. Ele quis dizer que eu já estava bastante gordo e não precisava almoçar. Ele sim.

domingo, 23 de maio de 2010

DESMERECIMENTO EM PROSA - "TÁ PEGANDO QUEM?"

A contabilidade já foi uma fria matéria de números resultantes das perdas e ganhos de financistas e produtores em geral. Agora está nos quentíssimos diários de beijos das meninas e nas embaladas conversas de meninos. Quantos beijos e quantas namoradas(os) no melhor estilo: - “tá pegando quem?” como se tirassem alguma mercadoria da prateleira para usar e devolver ou jogar fora e trocar por outra mais vistosa, cheirosa e gostosa. É um termo usual, muitos poderão dizer que é da moda, é da onda, é maneira, véi. Eu tô ligado, mas não me conformo mesmo assim. Entre tantos insultos à dignidade humana, entre tantas insignificâncias que estamos adquirindo para suprir nosso lado gente e empatarmos pari passu com as mercadorias, “tá pegando quem?” para mim está num dos primeiros lugares em termos de desmerecimento humano.



Hoje, tratarmos esse termo por conta das idéias de machismo e antigos ideais de feminismo não encontra mais eco no meio da juventude que sequer se dá ao trabalho de pensar a individualidade e a auto determinação como valores psicológicos e sociais. Estão em sua maioria nos embalos do que ditam os valores econômicos para serem transmitidos subliminarmente ao seu comportamento. Individualismo é a palavra mais apropriada para se conceituar as bases que sustentam o trato entre uma pessoa e outra ou entre uma pessoa e o restante da coletividade. É desmerecimento à medida que não se buscam mais outras formas de se qualificar relações fora de um sistema que envolva recompensas materiais palpáveis e imediatas. Qualificar, aliás vem sendo um gesto afirmativo de quanto vale, quanto custa, qual o resultado em termos de ganhos. Usurpou o significado de quantificar. Não arreda pé de um materialismo insistente em ser a única forma de valoração humana. Assim, o “Tá pegando quem?” significa uma materialização do indivíduo em um formato de coisa , de objeto de uso e descarte. Claro que os sentimentos podem acabar aflorando em algum momento, mas ele dificilmente vai se descolar da base que o originou: o ser coisa-propriedade, bem de consumo. Aí, quando e se aflorarem sentimentos é que vai ser determinado se o bem será de consumo durável ou não durável, tal como fazemos com os objetos e utensílios que nos emprestam alguma serventia no nosso dia-a-dia. Talvez por isso, complementem o desmerecimento tão gravemente com a uma ameaça velada a quem não se enquadra ou não quer fazer parte do jogo por qualquer motivo, dizendo: “a fila anda”.

sábado, 22 de maio de 2010

DESMERECIMENTO EM PROSA - PRECONCEITO

Há fenômenos que são tão evidentes, são tão marcantes, são tão universais que dá para falar deles sob muitos pontos de vista. inspiram muito, provocam muitas emoções e são racionalizados também por conta de sua manifestação. Uma lua cheia e o preconceito, por exemplo, são dois temas de que se pode falar de inumeráveis formas. Apesar de o primeiro ser um fenômeno natural e encantador e o outro ser um fenômeno social e assustador.



Um dia, véspera de final de um ano qualquer, o jornalista Boris Casoy falou em pleno jornal que estava no ar na televisão em rede nacional que os dois garis que desejavam feliz ano novo ao povo brasileiro eram o tipo mais baixo na escala social. Eles não teriam então o direito nem de desejar a tão sonhada felicidade para o próximo. É uma forma legítima de pensamento, essa do Boris, já que historicamente a elite nacional vive mesmo da hipocrisia, almejando resquícios de nobreza e jogando o lixo debaixo do tapete para os seus serviçais sem nenhum valor limparem depois. Um estudante de pós-graduação em psicologia da Universidade de São Paulo (USP) fez uma brilhante tese sobre a invisibilidade que têm certas pessoas na sociedade pela profissão que exercem. Na hierarquia de valores, o peso humano é medido pelo status não somente financeiro mas também profissional. Ele ficou oito anos passando-se por gari dentro das dependências do campus e não era notado pelos colegas e professores. Disfarçava-se com um macacão e vassoura nas horas que não estava nos estudos e assim passava incógnito durante a varredura à cata do lixo universitário. Pode-se considerar isso como um preconceito usual que estamos habituados a lidar. O aluno da USP conta que seus professores, colegas e orientadores passavam por ele e sequer olhavam em seu rosto. Dar bom dia, ou boa tarde, nem pensar. Parecia uma parte da paisagem daquele belo campus, menos notado, o entanto, do que os elementos fixos da paisagem tais como árvores, postes, prédios e outros ornamentos. Ele se movia, portanto não chamava a atenção. A sua ausência e não a presença somente seria notada se o campus deixasse de ser varrido ou o lixo fosse acumulando. Quanto ao Boris Casoy, dispensa comentários. Não creio que seja uma pessoa que mereça tecer considerações ao seu comportamento por trás de sua máscara verborrágica usando aquele bordão “é uma vergonha”.



Não há de medição para o preconceito. Todos são abomináveis. A desclassificação é a chave nesse terreno onde entra uma velada disputa. Se o ser humano não compete como os animais pela sobrevivência através da eliminação e o alimentar-se do outro literalmente, procura destituí-lo de qualidades para se sobressair. Isso é sobrevivência. Não importa a que preço. Um preconceito também indica o formato piramidal da sociedade. Quando se olha alguém de menos posse e lhe é dado tratamento diferenciado. Quando se olha uma pessoa de cor diferente e se faz julgamento considerando uma cor melhor do que outra, ou quando transforma a pessoa da outra cor em uma raça distinta e inferior. Quando se tem bens e se ganha reverência onde quer que se vá em função do patrimônio. Quando se trata a sexualidade diferente como deplorável. Enfim, eis mais uma forma de desmerecimento.



E temos os cúmulos: já ouvi de diversos donos de cães que quando estes se agitam muito diante de pessoas negras é por não gostarem da cor. Uai, pelo que consta dos conhecimentos científicos os cachorros não possuem a faculdade de distinguir cores! Então, quem é que não gosta?

sexta-feira, 21 de maio de 2010

DEIXE PARA A HISTÓRIA DE SUA VIDA UMA NOTÍCIA NOBRE *

NOTA PRELIMINAR: Eu havia escrito esta crônica no início desse ano, no entanto havia desistido de publicá-la por achar que estava me tornando impertinente, irritante e implicante com o tratamento demasiado humano aos animais em detrimento das relações humanas propriamente. Costumo acompanhar a Rosely Sayão, uma psicóloga especializada em relações familiares e educacionais, tanto através de seu blog como no programa SEUS FILHOS, junto com a jornalista Inês de Castro, apresentado pela rádio Band News. Para minha surpresa, ontem o tema foi sobre pais que estão negligenciando carinho e atenção aos filhos em troca do amor aos cachorros e gatos. Isso, pelo menos para mim seria sim, o famoso e indesejável “fim do mundo”. Para quem se interessar, leia, para quem acha que é exagero, o programa vai ser narrado neste sábado próximo. E, copiando o Raul Seixas, “para aqueles que acharem que eu tô mentindo, eu tiro o meu chapéu.”








A NOTÍCIA

Animais de estimação têm luxo e mordomia ao alcance das patas.



Os animais de estimação não têm do que reclamar. Em julho/09 começou a operar a companhia aérea americana Pet Airways, a primeira destinada a bichinhos de estimação. O avião leva 19 humanos e até 50 animaizinhos, porque as fileiras de bancos foram substituídas por gaiolinhas próprias para cães e gatos. Essa, porém, não é a única mordomia do reino animal. Roupinhas, acessórios de beleza, camas confortáveis, perfumes, alimentação balanceada, festas de aniversário, ofurô, personal dog, docinhos e até produtos inspirados em artigos de grife de moda fazem parte da extensa lista.


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Fonte: http://mulher.terra.com.br/interna/ 6/08/09.


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A CRÔNICA


Estou pensando seriamente em fazer uma série de crônicas apenas falando de cães e gatos. Acho que meu assunto já está ficando cansativo. Daqui a pouco não sei se vão ter assuntos fora de eventos oficiais onde os homens vão falar alguma coisa com os outros homens. No mais é com os bichinhos. Daqui a pouco também vou começar a sofrer ataques me insinuando como insensível, desumano (?). Tenho um álibi: possuo cachorro. Só que ele, apesar de bem cuidado, é tratado como cachorro.



Qual a diferença ente crônica, grave e aguda? Sei não, mas eu queria que este texto pudesse se chamar grave. Gravíssimo para ser mais contundente.



Como é bom acompanhar a evolução da humanidade! Eu agora quero propor eliminarmos de circulação popular alguns ditados ofensivos dos humanos relacionados aos animais. Alguns substituir. Coisas do tipo:



“Quem não tem cão caça como gato”. Ora quem não tem cão que arranje um imediatamente e cace logo algo para que se conforte. E gatos são para leite como ratos para queijos.



“Mais perdido que cachorro caído de caminhão de mudança.” Qual caminhão, o que vai levar os móveis? Onde já se viu misturar móveis com cachorro? Ele vai no carro da família. Só não é no banco da frente por causa da incompreensão das autoridades de trânsito. Os guardas ainda não evoluíram o bastante. Vão entender que, com cinto de segurança os bichinhos ficam comportadinhos na frente.



“Gato escaldado em água quente...” O que? Isso passa a ser crime inafiançável!



“Cão que ladra não morde.” Substituir para cão que ladra está carente de afeto. Já temos cirurgias de extirpação de suas cordas vocais. Latir é com cães sem teto, famélicos moradores de rua, que não despertaram ainda a sensibilidade das autoridades para lhes dar abrigo.



“Nós gatos já nascemos pobres, porém já nascemos livres.” Bom, nascer pobre é destino, viver como pobre é com os burros. Vai ter vida boa, porem dentro do conforto de um lar. A liberdade? Ora, tudo tem um preço também, não é gatinhos?



“Sofrer mais que cachorro zangado” será substituído por sofrer mais que menor abandonado. Meu único medo é se começarem a querer dar o tiro de misericórdia nas crianças de rua também.


* O título é parte de um trecho da música Rock da Cachorra , de Eduardo Dusek.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

BOM EM QUALQUER ÉPOCA - MANIA DE EXPLICAÇÃO

Há tanta produção literária por esse mundão, tanta coisa que tanta gente tem acesso e muito mais coisa que tanta gente não tem que pelo bem do conhecimento humano e da literatura, acho que toda oportunidade que tivermos para aumentar a visibilidade de textos bons não pode ser perdida. Selecionei alguns que acho que precisam de quando em vez ser divulgados pelas suas qualidades inumeráveis. É só mais uma forma de dar ainda mais vida à sua imortalidade. Só lendo para qualificar. E isso cabe ao leitor.




 
MANIA DE EXPLICAÇÃO *



(Adriana Falcão)



Era uma menina que gostava de inventar uma explicação para cada coisa.



Explicação é uma frase que se acha mais importante do que a palavra.

As pessoas até se irritavam, irritação é um alarme de carro que dispara bem no meio de seu peito, com aquela menina explicando o tempo todo o que a população inteira já sabia. Quando ela se dava conta, todo mundo tinha ido embora. Então ela ficava lá, explicando, sozinha.

Solidão é uma ilha com saudade de barco.

Saudade é quando o momento tenta fugir da lembrança pra acontecer de novo e não consegue.

Lembrança é quando, mesmo sem autorização, seu pensamento reapresenta um capítulo.

Autorização é quando a coisa é tão importante que só dizer "eu deixo" é pouco.

Pouco é menos da metade.

Muito é quando os dedos da mão não são suficientes.

Desespero são dez milhões de fogareiros acesos dentro de sua cabeça.

Angústia é um nó muito apertado bem no meio do sossego.

Agonia é quando o maestro de você se perde completamente. Preocupação é uma cola que não deixa o que não aconteceu ainda sair de seu pensamento.

Indecisão é quando você sabe muito bem o que quer mas acha que devia querer outra coisa.

Certeza é quando a idéia cansa de procurar e pára.

Intuição é quando seu coração dá um pulinho no futuro e volta rápido.

Pressentimento é quando passa em você o trailer de um filme que pode ser que nem exista.

Renúncia é um não que não queria ser ele.

Sucesso é quando você faz o que sempre fez só que todo mundo percebe.

Vaidade é um espelho onisciente, onipotente e onipresente. Vergonha é um pano preto que você quer pra se cobrir naquela hora.

Orgulho é uma guarita entre você e o da frente.

Ansiedade é quando faltam cinco minutos sempre para o que quer que seja.

Indiferença é quando os minutos não se interessam por nada especialmente.

Interesse é um ponto de exclamação ou de interrogação no final do sentimento.

Sentimento é a língua que o coração usa quando precisa mandar algum recado.

Raiva é quando o cachorro que mora em você mostra os dentes.

Tristeza é uma mão gigante que aperta seu coração.

Alegria é um bloco de Carnaval que não liga se não é fevereiro.

Felicidade é um agora que não tem pressa nenhuma.

Amizade é quando você não faz questão de você e se empresta pros outros.

Decepção é quando você risca em algo ou em alguém um xis preto ou vermelho.

Desilusão é quando anoitece em você contra a vontade do dia.

Culpa é quando você cisma que podia ter feito diferente, mas, geralmente, não podia.

Perdão é quando o Natal acontece em maio, por exemplo.

Desculpa é uma frase que pretende ser um beijo.

Excitação é quando os beijos estão desatinados pra sair de sua boca depressa.

Desatino é um desataque de prudência.

Prudência é um buraco de fechadura na porta do tempo.

Lucidez é um acesso de loucura ao contrário.

Razão é quando o cuidado aproveita que a emoção está dormindo e assume o mandato.

Emoção é um tango que ainda não foi feito.

Ainda é quando a vontade está no meio do caminho.

Vontade é um desejo que cisma que você é a casa dele.

Desejo é uma boca com sede.

Paixão é quando apesar da placa "perigo" o desejo vai e entra.

Amor é quando a paixão não tem outro compromisso marcado. Não. Amor é um exagero... Também não. É um desadoro... Uma batelada? Um enxame, um dilúvio, um mundaréu, uma insanidade, um destempero, um despropósito, um descontrole, uma necessidade, um desapego? Talvez porque não tivesse sentido, talvez porque não houvesse explicação, esse negócio de amor ela não sabia explicar, a menina.



 


* Este é um livro famoso, bom para crianças desde a mais tenra idade, até a idade em que a inquietação faz a gente não perder de vista o que seja inquietação. Eu o considero como um texto que ensina brincando, o que é a maneira mais rica de se aprender. Já foi também adaptado para o teatro.







 








quarta-feira, 19 de maio de 2010

SEGUNDAS INTENÇÕES

Dificilmente se vê hoje pessoas movidas pelo altruísmo. Ô palavrinha boa! Altruísmo para mim compõe uma mistura onde entram desprendimento, doação, boas intenções, generosidade, solicitude. É daquelas palavras de sentir. Tem umas palavras que nos tocam de uma forma que vai além do seu significado do dicionário. Ainda mais num tempo onde a abnegação tem se tornado uma das coisas mais raras que existem. Elas passam a ter uma espécie de substância que dá vontade de pegar e colocar no bolso, já que não dá para abrir o peito literalmente. Mas elas acabam entrando e saindo na forma de exteriorização em gestos altruístas, nesses poucos (e louvados sejam) seres.

Somos moldados desde muito cedo para agir por meio de recompensas, a partir do choro recém nascido que é acalmado com o peito, mamadeira ou colo. Depois, a satisfação de vontades e os limites que se recebe determinam o que vai ser dado em troca. Acontece principalmente na infância e adolescência. Daí para frente, está instalado o sistema de interesses. Não quero dizer com isso que mais tarde todos vão agir exclusivamente por interesses egoístas. Os interesses individuais são legítimos e aceitáveis dentro de um convívio ético. Do discernimento que cada um aprende com os recursos que lhe foram passados e com sua própria capacidade de negação e afirmação, do uso de seu livre arbítrio, é que nascem e crescem as pessoas que se desvencilham do interesse puramente particular e se propõem a uma vida de partilha, de pensar no outro e se tornam amigas, companheiras, benfeitoras. O interesse pessoal pode estar até mesmo em ser útil, de fazer a pessoa sentir-se bem sendo boa.



Do oposto do altruísmo, no entanto é que quero falar. Ele se manifesta em forma de ganância, inveja, sentimento de inferioridade, baixa estima agressiva e instabilidade emocional. Há estímulos externos que contribuem ainda mais para aumentar o peso dessas más companhias no indivíduo. Por exemplo? O apelo insistente ao sucesso pessoal que chega a tornar muita gente arrivista. Na maioria das vezes, o desejado não é propriamente o que o outro possui em termos materiais vistosos. Isso pode ser conseguido. Mas acaba sendo aquilo o que o outro é ou representa. Mesmo que não seja muita coisa, a insatisfação permanece nesse desejoso do alheio. Ele poderá conseguir tudo o que estiver ao alcance ainda assim não aplacará sua ganância, não se realizará o seu misterioso e obscuro intento. Acho que aquela velha e surrada dicotomia do ser e do ter fica balançando nessas cabeças de pouca ou nenhuma serventia para a nossa companhia. Quando as pessoas se aproximam de nós armadas até os dentes, talvez seja até mais fácil de lidar com a situação. Embora isso não as tornem menos incômodas do que quando a aproximação se dá da forma mais sutil e dissimulada que pode existir. Sabe aquela gente que se faz de amiga, de interessada em tudo na nossa vida, de uma hora para outra se apresenta como solícita e preocupada com o nosso bem estar? Pois, é: aí que mora um certo perigo quando a gente abre a guarda. Não por frouxidão, mas às vezes por boas intenções ou de pura carência. A turma do “tapinha nas costas” é, geralmente da mesma equipe que quer dar o soco, por tantos motivos insondáveis e outros mais evidentes, a ponto de suscitar aquele velho ditado “quando a esmola é demais até o santo desconfia.”

terça-feira, 18 de maio de 2010

SEM INTERNET

Quem consegue viver sem sentir uma saudade é porque não viveu o motivo. Eu vivo falando sobre o que já foi, o que fui e o que é. Dá uma vontade danada de vir a ser em muitas vezes, não voltar a ser em várias outras e ou fazer tudo de novo do modo como a experiência ensinou. Tecnologia demais e muito rápido faz aumentar a sensação de saudosismo.

Não sei se foi um vício que criei com a internet ou se ela sozinha conseguiu sozinha se tornar essencial ao meu dia-a-dia. Para publicar eu já tenho certeza. Para o resto ainda estou testando. Outro dia eu li numa entrevista com o Antônio Fagundes ele dizer que é avesso à internet pelo fato de que as tecnologias criam necessidades que a gente não tinha.

 
A respeito do meu teste: resolvi fazer uma proposta de ficar uma semana desconectado. Um blecaute voluntário. Se bem que as operadoras e os provedores já costumam fazer isso com a gente sem pedir licença nem perdão. Mas nesses casos, a gente não tem tempo de curtir a sua falta. A indignação nos faz buscar outros meios rapidamente enquanto ouve as gravações que são feitas para nos enrolar quando eles dizem estar sanando os problemas. Fiz uma proposta para mim e mais três pessoas de meu convívio diário. De cara, a minha filha não topou. Já pensou um jovem praticamente nascido e criado na era eletrônica ficar sem internet um dia? Que inferno seria para quem está em sua volta! Eles usam o celular até para ir ao banheiro!

- Pai, deixa de ser velho, isso não existe!

Um outro amigo lá de minha cidade me disse

- Olha, lá em casa eu posso até tentar, mas não tenho como fazer o trato, porque no trabalho eu sou obrigado. Então pensei que o meu outro amigo que mora lá no sul do estado, na zona rural, criando galinhas poedeiras (ele vende ovos caipiras). Esse aí, eu achei que um radinho de pilha o contentaria, ele me responde:

- Quer me dar prejuízo, meu caro? Um dia aqui sem internet, eu perco a chance de oferecer omelete, sacou? Internet para mim é sinônimo de omelete na mesa dos outros. Eis que fiquei sozinho na minha saudade auto estimulada. E vi que posso fazer muitas coisas como ler um livro com mais calma, passear quatro horas de bicicleta em vez de duas, levar o cachorro para um passeio para emagrecer, pois acho que a sua gordura é do sedentarismo por culpa da internet que me deixa sentado aqui o dia inteiro , cuidar melhor das plantas do jardim . Escrever eu escrevo de caneta, mando carta pelo correio, procuro palavras no Aurélio, pesquiso em bibliotecas nos livros de papel. E essa crônica não é sobre bancos, mas de banco eu tenho trauma. É o lugar onde o ser humano é mais vulnerável, do ponto de vista sócio-econômico. Se eu tivesse conseguido o pacto topava até atrasar umas contas. Esse eu prefiro na internet.

domingo, 16 de maio de 2010

NÃO DESLIGUE, É SÓ UM RÁPIDO COMERCIAL

Eu tinha feito um relato sobre ratos e homens, asco e crueldade, tortura e barbárie. Exterminei o rato. Fiquei na cabeça com o questionamento acerca da selvageria humana e me esqueci que podia ter chamado a dedetizadora que fica azucrinando o dia inteiro quando estou ouvindo rádio. Uma firma chamada Insetfone. O recurso da repetição de refrão funciona mesmo. A gente memoriza nem que seja de raiva. Mas dei meus pulos e resolvi com uma receita caseira o problema do intruso. Aí, acordei no outro dia e me peguei cantando o refrão do anúncio: “telefone ao menos uma vez, 3273 7373, 3273 7373, 3273 7373... acabe com os ratos de uma vez...”

O assunto é sobre antigos anúncios de rádio, aqueles jingles que ficam impregnados na memória e quase sem querer a gente sai cantarolando. Aproveitando que era de manhã, eu estava tentando me lembrar como era a musiquinha de ‘auris sedina’, umas gotas para dor de ouvido de recém nascidos, lá pelos anos setenta . Nem sei mais se existe esse remédio. Também se quisesse era só pesquisar na rede. Mas não o fiz, afinal não é minha intenção aqui. É apenas para exaltar a capacidade desses anônimos compositores que têm um poder fabuloso de alavancar vendas seja lá do que for. Pode ser produto ruim, marca desconhecida, plano funerário, veneno para inseto, enxada e até remédio amargoso há sempre um musiquinha que soa agradável, tem letra fácil, refrão marcante e melodia contagiante. Ou então o inverso, uma ladainha cansativa, irritante e repetitiva. O negócio é mexer com o subconsciente de forma a não esquecermos que a coisa existe e está disponível em algum lugar, ou através de um telefone. Vem à nossa porta ou então não há quem não fique sabendo como encontrar o produto. Genialidade do lado de quem quer vender e bestialização do outro da cadeia predatória de consumismo. A marca fica gravada com um efeito de convencimento impressionante. Os publicitários sabem muito bem as táticas e estratégias para plantar uma marca na praça. Basta ligar um rádio a qualquer hora para comprovar. A capacidade desses talentosos profissionais é tão grande que a gente prescinde de imagens. Ela se forma na mente pelo efeito sonoro. E assim vamos somando com a televisão e virando essas marionetes consumistas. Seria bom se eles, os jingleiros, fossem remunerados proporcionalmente ao lucro que geram para os donos dos anúncios. Sabe-se, no entanto e infelizmente que não.

Um rapaz que conheci na cidade de Mariana, o Euzébio, muito amável e ensimesmado, sonhava com uma banda metaleira. Seu pai, comerciante de posses lha comprou a parafernália toda, de bateria a guitarra, contrabaixo e violão, surdo e pandeiro, reco-reco e cavaquinho, violino e bandolim sopros e metais de percussão, coisas que dariam para montar uma orquestra, uma escola de samba ou uma banda propriamente como ele queria. Não sei o porquê do seu desconsolo, creio que não havia músicos na cidade com talento musical como ele para formar o time. Também não gostava muito de arredar pé de casa. Ele dizia que o mais longe que gostava de sair era até Ouro Preto, a dez quilômetros de distância. Em compensação era o cara mais requisitado por todo comércio, indústria e serviços da cidade e região para fazer jingles. Queria anunciar sapataria? Euzébio! Novidade na padaria? Euzébio! Jóias, perfumes, prataria? O cara era o Euzébio. Ajudava a vendar qualquer coisa. Ele chegou a fazer um jingle para mim quando fui comerciante. Se eu soubesse ia fazer um jingle pra ele. Uma espécie de metalinguagem musical (se é que existe isso) para compensar a sua desilusão de roqueiro e aumentar o seu potencial de faturamento em outras bandas.

sábado, 15 de maio de 2010

UM SELINHO

Obrigado, Menina., pela gentil indicação. Me sinto honrado
http://bymenina.blospot.com

Esse selo tem algumas regras a seguir:
- pegue o selinho
- responda a pergunta (O que é mágico para você?)
- repasse para 10 blogs

- indique de onde pegou o selinho
- ilustre com uma imagem


 Mágico para mim é um sonho ralizado, no entanto, inacabado, que gera outro, que gera outro...e que faz a gente nunca deixar de sonhar.




BLOGS QUE VÃO RECEBER
Sementes diarias
Vida Alta
Diario de Clarinine
Arquitetura e poesia
Mulher na Polícia
Sementinhas para crianças
Contos e Causos
Nas asas da coruja
Ilimitada mente
JornaLIZta

sexta-feira, 14 de maio de 2010

CHIFRE EM CABEÇA DE CAVALO




Já reparou que os cavalos não dão coices com as patas da frente? Deve ser por isso que eu me aproximo observando e fico procurando chifres na suas cabeças. Se não achar nada, pelo menos não corro riscos maiores do que umas mordidas. Pois é, disso eu fui pensar naquilo que move a inquietação juvenil atual além dos hormônios sexuais. O desejo de afronta, a necessidade de transformação, os impulsos à aventura estão adormecidos ou estão entorpecidos pelo poder da máquina de fazer de nós todos, marionetes de uma roda do consumo que não leva a muitas satisfações além daquela sensação de superioridade em uma disputa ferrenha de quem vai ter mais e melhor? Se não está sendo possível deixar um mundo melhor para as próximas gerações, por que então não deixar as próximas gerações em condições de construírem este mesmo mundo de uma forma que não seja esse caminho por onde vamos indo e onde já estamos enxergando o início do beco que não terá saída? A que lugar pode ir o mundo senão ao fim, de fato com um apelo em nível global que só interessa produzir e consumir mercadorias como sendo a finalidade única e assaz satisfatória para a humanidade? E quanto mais se produz mais se quer produzir e quanto mais se esgotam os recursos naturais, mais se arranjam formas de substituí-las por artificiais, num processo predatório e destruidor. E o que tem sobrado de contradição mais evidente no seio dos pensamentos dos quais querem amalgamar em um novo senso comum?  É tudo tão previsível em termos de perspectivas... Imprevisibilidade se acha apenas nos medos e paranóias individuais e coletivas sobre assaltos, sequestros e violências de todo o tipo. Mais não há que se pensar para um debate de acirrar ânimos de gente que está numa fase de desconstruções e reordenamentos interiores e exteriorizantes: a nossa outrora linda juventude.

A contradição, único alimento de agitação que existe hoje e que vem sendo considerada a coisa mais profunda em termos de validação de existências com bagagem intelectual e militante é em última análise: de um lado, os que acham o desenvolvimento da economia sendo barrado pela necessidade de se preservar o meio ambiente. De outro lado, os que querem preservar um ambiente salubre para a vida achando que a economia tem que respeitar alguns limites. E só.  E quem vai vencer nessa economia de argumentos? O dinheiro, certamente vai falar mais alto, pois não há mais como sequer se pensar uma organização social onde ele não seja a mola propulsora de tudo. Quer dizer, pensar até se pensa muito, mas soa absurda qualquer teoria que venha se opor ao culto que se faz aos bens materiais. Tudo se traduz em necessidade e todos acreditam que no fundo seja mesmo. O propalado “preço do progresso” que falamos até sem pensar às vezes no que isso significa, é o quanto custa para se criar a miséria humana em seu sentido mais pervertido. Tem sido assim na história humana. De consenso em consenso, vamos tornando o planeta quase insuportável de se viver com o uso dessa inteligência fenomenal que Deus deu aos homens. O mundo é grande e muito ainda desconhecido. Precisa de utopias para não se desnortear tanto seguindo verdades de uns poucos que julgam a bel prazer que são ou podem ser seus donos. Utopias precisam de idealismos para lhes dar forma. Quanta falta faz uma juventude inquieta com a ordem estabelecida...

quinta-feira, 13 de maio de 2010

HAVERÁ UM TEMPO

Haverá um tempo

Haverá um tempo que nossos acúmulos de arrogância, de intolerância e de disamor nos mostrarão a verdadeira face do que um dia fomos e do que somos, e não haverá mais volta ao mesmo palco um dia ora ensaiado;

Haverá um tempo que não teremos mais o véu do pedantismo e os tantos ares de certeza, que diuturnamente embacharam nossa visão hipócrita e tão curta, que tanto nos impediram de enxergar o próximo como nós enxergavámos a nós mesmos;

Haverá um tempo que nosso fardo do arrependimento do que deixamos de ser e de fazer será tão pesado que rogaremos pragas à nossa mais que certa interior putrefação, muito mais a interna que a da cansada carcaça;

Haverá um tempo que não teremos mais o poderio do metal, e suas mais impregnantes ilusões a comandar os outros, fazendo-nos esquecer de comandarmos nós mesmos;

Haverá um tempo que não teremos mais a tão confortável persona para esconder nossas mais fétidas intenções, teremos a mais depravada constatação do que somos para quem quer que nos veja, muito mais ,e sobretudo para nossos próprios espantados e dilacerados olhos triturados pelo remorso em vão;

Haverá um tempo que nossos pés tão calejados pelos asqueirosos e tão largos caminhos de tantas andanças mal pensadas, ostentarão as chagas mais ardidas do arrependimento e a angústia reincidente dos caminhos mais nobres e estreitos que desprezamos sãos;

Haverá um tempo que nossos mais ecoantes rangeres de dentes não nos amenizarão o amargor de tanto tempo perdido e empurrado ao léo de nossas descrenças em sermos bons;

Haverá um tempo que procuraremos o alento, entre os mais variados desencantos sem alucinação, enxugaremos o nosso próprio pranto,pranto já sem lágrimas da decepção;

Haverá um tempo que não teremos mais o tempo, tempo desperdiçado, mal tratado como nosso próprio coração, não teremos mais os ponteiros certos, coesos do tempo que escapou das nossas pouco zelosas mãos;

Haverá um tempo que mesmo nessa escassez de tempo, legião de companheiros incansáveis rodeados de luzes apaziguadoras de cores inimagináveis e indevassáveis nos arrebatarão por dentro, filhos sem moradas e só com o tormento, serão resgatados pelos seus próprios intentos, a luz mantenedora da serenidade que já não era crível há tempos, preencherão nossa luz opaca, nos devolvendo um tempo, agora mais valorado pelo sofrimento,seremos só luz recriadoras de nossos templos, onde a caridade fará morada e o amor será o sagrado sustento.


Dedico estas singelas linhas a inspiração que por ventura tenha sido carinhosamente e quase que despercebidamente a mim compartilhada, como também a toda legião de benfeitores da luz que labutam no amparo e incansalmente na manutenção do verdadeiro amor em nossos corações em quaisquer planos que nós estejamos.
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AUTOR: Felipe Padilha di Freita, grande poeta recifense. Escritor também do site recanto das letras, onde pode ser acessado através do link:  http://recantodasletras.uol.com.br/poesiasespiritualistas/2249767

quarta-feira, 12 de maio de 2010

ZÉ MIJÃO

A NOTÍCIA

XIXI NA CAMA PODE TER CAUSAS GENÉTICAS, DESTACA MEDICINA.

Dra. Jennifer Abidari



Algumas semanas atrás, atendi uma garotinha de cinco anos que ainda fazia xixi na cama toda noite. É uma reclamação comum: pelo menos 15% de crianças saudáveis de cinco anos de idade não passam uma noite completamente secas. Fazer xixi na cama é bastante comum até em crianças mais velhas. ..

... não se trata de problemas emocionais, ou erros que os pais fizeram durante o treinamento para o uso do banheiro, ou preguiça, que algumas pessoas ainda atribuem ao fato de fazer xixi na cama (e o problema é cerca de três vezes mais comum em meninos do que em meninas)...

De fato, uma das piores coisas de fazer xixi na cama é o estigma...

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Fonte : http://www1.folha.uol.com.br/folha/equilibrio/noticias/ult263u681399.shtml - 19/01/10
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A CRÔNICA



Eu já havia confessado publicamente que fiz xixi na cama até os doze anos. Foi uma forma de lavar a alma. Isso por que o resto foi a minha mãe quem lavou. Colchões e mais colchões; lençóis e mais lençóis Uma maneira também de criar um mecanismo psicológico de negação de culpas que carregava. Funcionou que foi uma beleza! Agora vem essa notícia para me lembrar tudo de novo! Que coisa! Então o jeito é ir contado mais detalhes de como as coisas se davam, quem sabe não saio com uma cura definitiva sem divã, já que, pelo visto, o assunto volta e meia vem nos noticiários. Ou melhor, meu analista ficam sendo os leitores, mesmo que não me falem nada, apenas ouçam a angustia de um ex-mijão.



Era quase todos os dias. Minha mãe não me castigava fisicamente por causa disso, mas o castigo psicológico, creio, doía mais. Então, quanto mais era ridicularizado perto de meus irmãos, mais colchões novos eu ganhava. Dos nove irmãos eu era o único que trocava de colchão pelo menos a cada três meses. Naquelas madrugadas, quando o calor da urina me vinha fazer companhia sob o cobertor, eu me levantava num pulo e virava rapidamente o colchão para baixo, na ingênua esperança que não fosse notado no dia seguinte. O pior era que escorria mais rapidamente e formava aquela poça debaixo da cama, me denunciando antes mesmo que o cheiro característico o fizesse ou antes de serem trocados os lençóis. E também tinha o problema de ter que tomar banho no meio da madrugada. Não dava para ir à escola daquele jeito. Os irmãos quando queriam me provocar chamavam-me de Zé Mijão. Minha mãe fez até um verso pedindo à Nossa Senhora da Conceição para compadecer de mim. Não sei o que a Santa tem a ver com isso, nunca soube que ela era a padroeira dos mijões na cama. Mas enquanto ela cantava, eu chorava. Muito tempo depois eu ficava tentando me lembrar quando foi exatamente o dia em que não fiz mais. Deveria ter merecido uma comemoração. Não teve. Acho que ninguém, nem mesmo eu acreditava que o último dia teria sido o último dia.



terça-feira, 11 de maio de 2010

RATOS, TORTURA E PENA DE MORTE

O rato apareceu em minha casa fazia uma semana. Pelo menos foi o período de convivência aterrorizante com ele no mesmo espaço, desde que o vi pela primeira vez. De cara, já dei a sentença: está condenado à morte. Eu tenho uma sensação de asco que dizem ser instintivo. Não é nada. Imagine aonde iríamos arranjar os bravos trabalhadores que vivem do seu combate nas firmas de dedetização? Mas enfrento-os desde que não tenha que tocá-los com a mão. Vassoura, chinelo, pedra, até da minha cachorra eu solicitei auxílio na sua captura. Em vão. Eles são sorrateiros e possuem uma dose de inteligência para o embuste e uma agilidade que poucos animais têm. Acho que a palavra sorrateiro vem dos ratos, sei não.

 

Bom, desfeitas todas as possibilidades do enfrentamento armado, eu resolvi combatê-lo pela fórmula infalível que me disseram dos tais venenos que os desidratam até a morte. As ratoeiras tradicionais já não são mais sequer ameaças para esses seres urbanizados e que aprenderam os dribles nas armadilhas que lhes são impostas pelos humanos. Deve ser por isso que tem essa quantidade nojenta (eu acho) de filmes onde os ratos são heróis. Uma rendição humana momentânea à sua sagacidade e perspicácia, transformada em lição de vida. Não gosto, definitivamente do exemplo cinematográfico. Exceção para Tom e Jerry, uma gracinha de desenho animado!



Todos os dias eu colocava sob os móveis e eletrodomésticos uma quantidade de “ração” envenenada e nada de afetar-lhe os modos. Volta e meia eu ouvia ruídos na minha madrugada de escrevinhador e quando ia em direção ao barulho, o intruso já havia se escafedido misteriosamente. Um belo dia, eis que estou chegando à cozinha e o vejo saindo debaixo da geladeira e parando lentamente. A visão foi de um brinquedo à pilha que andava e de repente acabou a carga de energia. Ele parou, me olhou, eu o olhei e ficamos os dois estáticos. Eu, de nojo e pavor e ele de esgotamento das funções vitais. Mesmo assim joguei-lhe um pé do chinelo e errei. Joguei o outro e ele sequer se moveu. Aí me dei conta de que eu havia vencido as suas resistências. Estava à beira de um colapso cardíaco ou o que quer que seja o efeito do veneno. Peguei uma vassoura e dei o golpe final que lhe extraiu um grito estridente e inesquecível. Mais um susto. Ainda havia um restinho de vida. Fui mostrar a todos na casa a minha façanha, afinal todo mundo estava em polvorosa com a sua presença. Coloquei-o numa pá de lixo, abri um fundo buraco e o enterrei, jogando por cima da sepultura, vinagre e amoníaco para que a cachorra não fosse lá depois escavar. Ele estava com um semblante até simpático para quem morreu depois de ingerir tanto veneno (foram mais de oito pacotinhos que eu comprei). Seus olhos permaneceram abertos e isso me deixou depois um incômodo. Não foi nenhuma piedade, apenas um incômodo incompreensível Não dá para comparar um rato a humanos nesse sentido literal, mas dá para se ter uma noção do que seja a tortura e a pena de morte humanas, do ponto de vista do algoz. Que sentimentos será que tem uma pessoa que tortura deliberadamente um semelhante ou lhe mata, seja através da pena legal, consentida, seja através da fúria momentânea ou da premeditação? Acho que encontrei uma finalidade para a existência desse animal, para mim o mais nojento e asqueroso do reino. O rato firmou as minhas convicções já antigas de abominar gestos humanos de crueldade e barbárie.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

O CONTO DO COCÔ DE CACHORRO

A casa inteira já estava acostumada aos hábitos do cão. Assim tem sido desde que o homem resolveu que os animais passam a ter uma certa primazia em sua vida. O padrão ideal que tem feito um tremendo sucesso na atualidade é uma família média, casal com dois filhos e um animal doméstico. De classe também média em modos de consumo e poder aquisitivo, de pensamentos médios acerca das problemáticas solúveis e insolúveis da existência. Desde, claro que morem em condomínio onde o regulamento permita animais ou tenham as suas próprias casas independentes. A casa se adapta aos hábitos dos bichos para não deixá-los estressados, Para isso, quero dizer, estressados já bastam os donos que andam as turras com seus semelhantes e com raiva do mundo. Os bichos precisam sempre estar com aquela abanada alegre de rabo para demonstrar que tem alguém que gosta dos humanos. Os cachorros gostam muito. Ainda mais se forem bem tratados.



O cão da casa, desde que largou as tetas da cachorra sua mãe estava habituado a comer apenas ração por decisão de harmonia da família. Coisas de gente que não gosta daquele cheiro insuportável de cocô de cachorro que come carne e restos de comida dos donos pelo terreiro. Mas a preguiça, sendo mãe do progresso, é também algoz dos próprios preguiçosos de vez em quando. O cão, chegado às mordomias da casa, entrava em todos os cômodos e ficava em volta do fogão ou da pia quando alguém preparava uma comida qualquer. Acabava ganhando um pedaço de qualquer coisa e já não dava mais sossego se não ganhasse um pedacinho de carne, um miolo de pão com manteiga, legumes, talos de verduras; até salgadinhos e refrigerantes lhe davam de vez em quando. Família é isso, não esqueçamos. Essa união indissolúvel que os animais domésticos construíram com o ser humano desde épocas muito remotas e turbinadas agora , na modernidade pela solidão e indiferença dos homens uns com os outros. Então, êta cão para comer comida! Já estava ficando viciado num prosaico prato do dia e a ração durava meses. Tanto que chegava a perder a validade. Ele tinha lá nos terreiros da casa seus cantinhos de fazer as necessidades. Exceto quando era período chuvoso. Cão danado. São Pedro cismava de lavar o seu território e então ele escolhia outro qualquer, desde que estivesse sequinho.

O seu dono, o Jurandir, o mais médio e vistoso exemplar da classe média era muito escovado, cheiroso, alinhado no trajar e outras periquitices que a vaidade humana vai aderindo com a oportunidade que lhe é oferecida no mercado da beleza. Os seus sapatos, sempre muito brilhantes, eram de bico mais fino e depois mais retangular, conforme a moda ia evoluindo para o caricato ou não, dependendo de cada onda que a televisão mostrava de padrões de beleza ou a verba que a família tinha disponível. Naquele dia tinha uma reunião importantíssima no escritório e estava atrasado. Tomou o banho habitual da manhã, seu café e saiu na correria tão corriqueira dos dias de hoje. O ônibus também não variava. Nos horários de pico, lotado. Então era comum um cheiro ou outro destoar daqueles corpos amanhecidos com aparência insuspeita. Segundas feiras, muito cheiro de álcool nos hálitos e no resto da semana os mais comuns. De perfumes a sovacos menos perfumados e hálitos não muito aproximáveis. Mas tinha um cheiro estranho naquele dia. Olhou, cismado se eram as solas dos sapatos e viu que não era com ele. Foi-se, preocupado com o horário. Chegou e a reunião já estava para começar. Não era somente ele o atrasado.



Uma pausa. A vantagem hoje na correria das cidades é que você marca um compromisso e se atrasar, provavelmente o seu interlocutor também vai, afinal o trânsito é bastante democrático em termos de fornecer o caos. Só mesmo quem possui helicóptero escapa dos engarrafamentos. Esse já está numa classe acima da média. Ou então se sair de casa ainda na madrugada. Esse já está numa classe abaixo da média.



Bom, então o Jurandir teve tempo de refrescar-se em frente ao ventilador da sala da secretária para espantar um pouco do suor que lhe incomodava as belezuras da indumentária. O cheiro continuava muito próximo a ele. E agora incomodava a todos que aguardavam na sala e olhavam-se entre desconfiados e constrangidos. Com a chegada do chefão, eis que entram todos para o local da reunião. O cheiro lá, impregnado nas narinas. Ninguém identificava a origem do catingueiro, então poderia ser com qualquer dos presentes, exalando de algum ponto não localizado. Aquela firma, como não era do ramo de alimentos nem de cosméticos ou ainda de produtos de higiene, concluiu a sua reunião estando todos com cara de cismados. E o Jurandir só viria a saber que era com ele de volta à sua sala, sozinho mas acompanhado do odor. Trancou a porta por uns instantes, tirou toda a roupa, cheirou-a e ao tirar os sapatos é que descobriu que havia pisado com a pontinha do sapato no cocô do cachorro de modo que não dava para ver levantando-se a sola. E o cocô se instalara ente a sola e a costura do pé esquerdo. O clima ia ficar ruim para o cachorro quando ele voltasse para casa, o que fez imediatamente de táxi e descalço, com os sapatos providencialmente embrulhados em um jornal velho.



P.S:

Este é um conto de quase ficção. Qualquer semelhança com fatos ou situações da realidade, eu mudei o nome do Jurandir.

sábado, 8 de maio de 2010

MÃE CORUJA

Vilma foi à feira livre com uma disposição alegre. Despertou num daqueles dias em que nem o cinza das nuvens muda a cor do humor da gente quando acordamos com alegria para o mundo. Na feira livre, há a oportunidade do contato com as coisas da terra, que têm um poder mágico, senão de aumentar, pelo menos de manter a disposição. Fora a chance de poder estampar no rosto a satisfação para todo mundo ver que a vida pode ser bem melhor do que pensar nas metáforas de abacaxis e pepinos ou dar uma banana para alguém. Comprou, comprou e acabou o pensamento numa boa ação. Afinal, dar bananas para alguém não quer necessariamente dizer que esse alguém não vá ficar feliz, sendo bananas de verdade, longe das alegorias do gesto bananoso de mandar alguém se ferrar. Era isso, enquanto comprava as outras verduras, legumes e frutas, pensou na sua filha. Gostava de bananas. Fazem muito bem para a saúde física e mental dos adolescentes em fase de crescimento. Possuem fósforo, sódio e potássio, sais minerais essenciais aos meninos e meninos se desenvolvendo e estudando. Comprou um pouco a mais do que costumava e como passava pela porta da escola da filha, resolveu entrar um pouquinho. Foi assim que a Vilma me contou.

– O que a gente não faz para alegrar os filhos, né? Era a hora do intervalo para recreio e podia muito bem fazer uma surpresa agradável para a Brisa, a menina que gostava tanto da fruta tropical. As caturras então, hum!!!



Distraída nas conversas pelo pátio da escola no meio das amigas, provavelmente falando de alguma professora ou de matéria fácil ou difícil, muito ao contrário do que pensam os adultos que acham que elas ficam fofocando sobre meninos bonitinhos da escola ou da rua. Não entendem nada do mundo sério e preocupado com os estudos. Esses adultos! Quanta maldade! De repente, alguém avista a sua mãe e a avisa. Ela sai logo correndo em sua direção, pensando ser notícia ruim. Como comparecer àquela hora, interromper “aquele assunto” se não fosse para trazer uma má notícia, quem sabe até buscá-la para ir lhe confortando pelo caminho para absorver melhor o impacto dos acontecimentos? Mas o sorriso da Vilma radiante desfez a suspeita. E mais ainda quando ela lhe entregou o embrulho. Uma penca de bananas, ali, no recreio, no meio de toda a turma. A menina foi ficando rosada e avermelhando à medida em que a vergonha se misturava com a raiva. Meu Deus, como pode ser insensata! Me trazer bananas na escola, na frente de todo mundo, ainda por cima me fazendo parecer uma criança?

_ Mãe eu vou fazer de conta que nem te conheço. Foi tudo o que conseguiu dizer, saindo em disparada para a sala de aula. E a Vilma nem teve tempo de falar que era um lanchinho para reforçar sua alimentação. Para a menina, o maior mico de toda a sua existência.

– Pode véi, uma mãe dessas!!! Foi o que ela me contou depois.

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Este texto ia fazer parte de um concurso promovido pela Rádio Bandnews: MÃE CORUJA (Mães sem noção, um mico inesquecível). Era para ser narrado ao vivo lá na rádio, mas preferi escrever para não cair no esquecimento da família.



E com ele homenageio a todas as mães no seu dia. Que seja ele feliz juntamente com todos os demais.
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