sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

LEGADO

O meu legado, Maria
Não terá pompa nem hipocrisia
Não comportará heresia
Também não gerará mais-valia
Pois só o que tenho é poesia

Quando for ter contigo, Maria,
Terei já deixado por aqui o melhor que havia
Amor, trabalho e alegria
Poemas e prosas de vária serventia
Menos dinheiro, menos matéria, menos algia



À minha mãe
24/12/1931
18/06/1983.








Desejo a todos um lindo Natal, cheio de alegrias, saúde plena e generosidade humana. Muita paz e muito bem.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

UM APAGÃO

O desastre foi como um terremoto vindo de fora para dentro. A terra não tremeu em seu interior, foi uma espécie de desalinhamento orbital que gerou uma sacudidela muito leve. Mas o suficiente para desorganizar toda a vida da superfície. E o primeiro efeito e o mais visível, paradoxalmente, foi a falta de energia. Apagam-se todas as luzes, as transmissões de televisão, rádio e internet. Não há noticias as não ser pelos velhos radinhos de pilha, mesmo assim daquelas emissoras cujos geradores movidos a combustível funcionam. Dá para se ter algumas noticias localizadas. Um apagão geral.

As imagens voltaram a ser mentais norteando os desejos e vontades de todo mundo. O que é visto é cobiçado mais do que qualquer outra sensação humana. As pessoas não estão acostumadas a formar, a idealizar a partir de imagens mentais. A leitura dos olhos é que guiou desde sempre os anseios. Então, todo mundo novamente teve que reaprender, assim como as crianças antigamente iam vendo o mundo e perguntando os porquês. A visão é dos nossos sentidos, o que mais imediatamente nos privilegiou para a contemplação das coisas. O bombardeio de imagens feitas pelo homem fora do mundo da arte nos turva, nos agride, nos ceifa a capacidade contemplativa. Provoca uma espécie de dormência fazendo o tato e a audição suplantarem o nosso estro criativo. Tudo o que se nos mostra é para aguçar o desejo de possuir a coisa mostrada, ou o que estiver por detrás dessa coisa mostrada.

Um cenário de apaziguamento é o que se vê por todos os lados por causa da necessidade que uns passam a ter dos outros. E então os olhares se voltam de pessoa para pessoa. Quantos diálogos olho no olho! Quanta gente reunida em esquinas e ajudando-se mutuamente. Diminuem-se as desavenças, diminui a indiferença, aumenta o potencial humano de todo mundo, pelo menos até voltarem as luzes que devolveriam a artificialidade ao mundo encantado de sons, imagens, anúncios luminosos, dos comerciais, dos vídeos, do sonho dos computadores.  Downloads mentais eram tudo o que estava ao alcance da criação humana. A cópia, por outro lado, não estava ao alcance, que bom! Se nada se criava, nada também se copiava. Mas tudo se transformava. A propaganda toda voltava a ser cinza e com voz chamativa por detrás. Quem queria vender tinha que escrever em papel e usar a fala direta no convencimento. Quem queria se mostrar, tinha que desfilar aos olhos individuais para ser submetido ao crivo dos gostos agora não tão uniformes, não tão manipulados para a formação de um senso comum.

Então, embora as coisas não pudessem voltar a um primitivismo de ralações, adquiriram  um primitivismo de não sujeição. Uma relativa horizontalidade nas relações. Pelo menos até voltar a energia que nos conduz ao que nos coloca limites. É como se voltassem todos a ser crianças, porém sem adultos que desvirtuassem sua imaginação e fantasia de observadora e portanto, de criadora de sua própria realidade. É incrível como somos guiados pela sistemática das recompensas. Como passou todo mundo a depender de todo mundo, deu para sentir uma demasiada mostra de humanidade no ser humano. A luz do dia e a penumbra mal iluminada pelas velas, lanternas e faróis devolveram ao homem a capacidade contemplativa. Com ela veio de volta a tolerância, os significados passaram de objeto para não-coisa, gente.
Uma pena que a luz foi restabelecida às vésperas do Natal

domingo, 19 de dezembro de 2010

DICAS PARA EVITAR O ESTRESSE ANTECIPADO

Com as novas tecnologias, vêm também novas formas de antecipar as coisas, obter vantagens, benefícios e... estresse. Como vantagens e benefícios são poucos que se oferecem e estresse tem de sobra, aqui vão algumas dicas para se evitar. Não desaparecendo os efeitos, recomendo chá de camomila quatro vezes ao dia.

- A receita federal tem oferecido, quase imediatamente após você ter entregado a declaração do imposto de renda, a oportunidade de saber se a sua foi processada através do seu site. Nunca faça isso. Uns três dias após a entrega, você já pode saber se está na malha fina. O pior é que não se pode saber quando vai receber a restituição. Vá somando pontos como sedativo se você não caiu em tentação.

- Achei uma resposta infalível para o telemarketing: Depois de umas oito negativas de adquirir um produto que queriam me empurrar, resolvi disfarçar-me de Ricardão (espero que ele não leia isso): Atendi e disse que o Sr José Cláudio havia falecido em um terrível desastre.
- Aquele do avião? Perguntou-me a moça.
- Não, mas foi bem trágico também. E o pior, o desgraçado deixou a viúva aqui cheia de dívidas. Eu achando que ia ficar no bem bom, vou ter que ralar para ajudá-la a pagar.
Ela pediu mil desculpas ofereceu suas condolências e nunca mais ligou. Creio, inclusive, que falou com outras empresas. Ninguém mais tem me ligado para oferecer o paraíso em suaves prestações.
(P.S.: contra o gerúndio nos atendimentos não tem remédio ainda)

- Para quem pensava que o rádio estava em desuso, obsoleto, experimente carregar na bolsa ou no bolso esses aparelhinhos de mp3,4,5... Não há nada melhor para filas intermináveis, ônibus, metrô e outras paradas indesejáveis. Mas, atenção: tem que ser rádio, não música gravada. É que entre uma musiquinha e outra, sempre tem uma notícia, uma agenda cultural, um caso inusitado que inspiram um poema, um causo, uma crônica, um pensamento criativo. Cuidado com os programas de curas e rádio polícia. O efeito é inverso.

- Em cidades medias e grandes, use o carro somente em casos fortuitos de força maior. Calma! O transporte público é uma  porcaria, eu sei. Mas nada se compara ao trânsito de carros particulares. Nenhum inferno é mais quente. Em todo caso, qualquer dos meios de transporte que for usar, sempre saia de casa uma meia hora antes do habitual. Leve um biscoitinho ou uma maçã. A gente nunca sabe...

- Se você é usuário involuntário e necessitado do SUS, não precisa ler esse tópico. Se tiver um plano de saúde, sugira aos médicos (eu tenho feito isso) para pararem de colocar a revista Caras na sala de espera. Ou, no mínimo variar! Estou começando a desconfiar que os médicos é que gostam daquela porcaria. Como eles podem supor que todos os pacientes gostam de ficar vendo aquelas futilidades com calma e terem que esperar uma, duas horas para a consulta que havia sido agendada com uma semana de antecedência? E ainda por cima, revistas de seis meses, um ano atrás? Podia ser pelo menos Mônica, Cascão, Cebolinha.... A gente tem alguma coisa para ler e nem vê o tempo passar.

Em todos esses e demais casos, não faça cara feia ou de raiva como deve estar fazendo ao terminar essa leitura. Mantenha o bom humor sempre.

sábado, 18 de dezembro de 2010

SE SOBRAR UM TEMPINHO...

O tempo é uma categoria abstrata inventada pelo homem para medir entre outros afazeres, o seu próprio vazio existencial.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

SOBRE PRIVILÉGIOS

imagem:opiniaopublica3.zip.net



Diz a constituição: “todos são iguais perante a lei”.

Exceto os que possuem foro privilegiado?

Quem fez as leis e quem as julga são os detentores desse privilégio.

Me faz lembrar de uma esperteza que a gente usava inocentemente na infância: “quem parte e reparte fica com a maior parte.”  

Será que os legisladores e juristas levaram isso a sério?

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

NOTA DE ESCLARECIMENTO


ALTERAÇÃODE PERFIL

Tive que alterar meu cadastro aqui Blog e no Recanto das Letras (RL), incluindo mais um nome. Para aqueles que não gostam muito de mim deve ser uma tristeza. Ter que agüentar Cacá e José Cláudio ao mesmo tempo será um suplício.

Explico: estou sendo acusado repetidas vezes de plagio descarado, cópias do tipo Ctrl+C  e  Ctrl+V, sem mudar uma vírgula ou sequer o título.Tenho recebido mensagens  ofensivas com frequência. Mas dou razão a quem as enviou, embora muitos não fizessem uma identificação ou deixassem um endereço onde eu pudesse responder. Plágio é mesmo uma abominação imperdoável.

Antes de me ingressar no RL eu já possuía esse blog, onde uso Cacá. Quando tentei me cadastrar assim no Recanto, não foi aceito por já existir esse nome ou apelido. Fiquei meio furioso momentaneamente, afinal, Cacá é como sou chamado desde priscas eras. Só passei a gostar de usar o José Cláudio por causa de minha mãe. Um dia, poucos meses antes de vir a falecer ela me disse que passaria a me tratar pelo meu nome de batismo novamente, pois era assim que ela havia escolhido.

O lado bom das ofensas é que sempre que as recebo a pessoa está defendendo um ou  outro. Dizem que gostam do que o José Cláudio escreve e o Cacá seria um engodo, uma falácia, um trapaceiro, uma fraude em pessoa. O oposto também ocorre do mesmo jeito.

Então, esclarecido o imbróglio, aqui passo a figurar como Cacá - José Cláudio. E no Recanto, como José Cláudio Cacá . E que esta ordem não piore a qualidade.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

BIG BROTHER

http://www.libertar.info/news/big-brother-a-internet-das-coisas-esta-a-caminho/



Depois do Wikileaks ninguém que faz uso da internet vai poder reclamar de não ser um potencial candidato a participar de um Big Brother (em nível mundial). Pode não dar dinheiro mas a pessoa terá seus minutos de fama garantidos .

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

LEÃO

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- Se é verdade que “o cachorro é um ser humano como qualquer outro” (segundo palavras de um ex-ministro do trabalho),

 - E já que ninguém está disposto a acompanhar o “troque seu cachorro por uma criança pobre” (segundo recomendou o Eduardo Dusek em uma  canção),

Estou inclinado a fazer uma solicitação aos deputados e senadores para que aprovem uma lei que permita a gente incluir os cachorros como dependentes no Imposto de Renda. Minha cachorra adoeceu e estou gastando uma fortuna com consultas, exames e remédios, tal como se gasta com humanos.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

CLASSES SOCIAIS

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DEPOIS DE MAIS UM PASSEIO NO SHOPPING

Descobri que a divisão de classes em A, B, C, D e E só serviu até agora para o preconceito, a discriminação e o endividamento progressivo.

domingo, 12 de dezembro de 2010

CHARADA FAMILIAR (I)

Eu havia publicado esta charada faz um tempinho e recentemente, lendo um texto divertido na página da Mari (meu cantinho de Sonhar), não só me lembrei de uma charada das famílias modernas como atualizei a minha. É que, de lá para cá mudou alguma coisa. Está lançado o desafio a todos que quiserem tentar desvendar (a partir do segundo parágrafo).

CHARADA DAS FAMÍLIAS MODERNAS
Conversa de uma mãe com seu filho de quatro anos, reproduzida em programa sobre as famílias novas e complexas, apesar de não mais problemáticas do que as consideradas normais.

- Mãe, o Julinho é seu filho?
- Não, ele é filho do primeiro casamento do seu pai.
- E o Marcelo é seu filho?
- Ele é filho do segundo casamento do papai.
- A Belinha é filha do papai também?
- Não, ela é filha da mamãe, do primeiro casamento.
- (???) Mãe, eu sou seu filho?

MINHA CHARADA
Eu, além de me identificar não resisto e proponho que decifrem a minha charada familiar. Minha família também é diferente, mas não dá mais trabalho por isso. Tentem:

Minha filha mais velha tem três irmãos, sendo que só dois deles são irmãos entre si. A minha filha mais nova tem uma irmã mais velha e não é irmã dos outros irmãos da mais velha. Ou seja, tenho duas filhas, sendo que a primeira tem três irmãos e a segunda tem uma irmã.
PS: A  minha filha mais nova agora tem , além de uma irmã mais velha, um irmão mais novo (atualizado a partir de junho/10)

sábado, 11 de dezembro de 2010

LUTAS MORNAS, QUASE FRIAS

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Sou saudoso de um tempo em que sociedade organizada significava mais do que filas individuais.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

JÚDICE

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Uma vertente da psicologia diz que aquilo que não conseguimos resolver em nós mesmos, colocamos na conta de destino. Pois quis o destino que por uma desavença mal curada entre um casal, o filho viesse a ter o nome que acabou sendo a expressão quase gramatical da pendência. A mãe queria homenagear seu próprio pai, o avô do menino e propôs que se chamasse Juvenal. O pai, dono, senhor da razão e das verbas de manutenção da família encasquetou que seria Lídice. Esse nome era uma homenagem às suas origens ancestrais, lá de uma pequena cidade da antiga Tchecoslováquia de onde sua família havia fugido para o Brasil da perseguição nazista durante a segunda guerra. Não chegaram a ir às raias do tribunal mas o menino veio a se chamar Júdice. Era o resultado de um mal costurado acordo através das junções de sílabas e partes dos dois nomes desejados por cada um.

Não viveu “sub judice” mas  por influência do meio tomou gosto pela encrenca ao longo de sua existência. Durante o seu périplo pelo mundo suas inquietações pareciam ser uma transferência genética do nome para o biotipo, para a psique e para o tipo social em que se transformou. Quanto ao físico, a característica mais marcante era o olhar desconfiado, além de um inseparável boné que usava com a aba sempre virada para trás ou para um dos lados. Para frente, dizia ele, atrapalhava a sua visão apurada. Com isso queria indicar que seu olhar fazia parte da sua perspectiva notória de que para tudo o que olhasse tivesse um potencial de resolução imediata ou questionamento idem.

No aspecto psicológico, exibia um quê de superioridade de conhecimentos acerca de qualquer assunto que lhe caísse aos olhos ou ouvidos. Sempre com a inconfundível exclamação de autoridade: “Péra lá! Deixa que eu resolvo”. Esta expressão antecipava o que ele considerava ser essencial: dar a sua opinião antes de alguém prosseguir com qualquer afirmação, negação, explicação ou até mesmo a continuação de um caso qualquer que estivesse sendo dito, ainda que o assunto não fosse de sua alçada e nem se a conversa não fosse com ele.

Socialmente se engajou no movimento do grupo de jovens da igreja do bairro e não demorou a ser convidado a sair, pois achou que com o tempo e sua argumentação persuasiva podia mandar mais do que o padre. O capelão, desconfiado e experiente, precaveu-se:
- Vai que esse menino daqui a pouco resolve encarnar Jesus...!
Convocou-o para a função de coroinha, o que foi prontamente negado. Júdice achava muita subserviência para sua ampla noção de mundo. Tocar sino, carregar hóstia, vinho e demais apetrechos de missa para ele era função de menor importância.

Nas primeiras séries da escola e com um talento desse tamanho para a contenda todos apostavam que ia ser um advogado, um juiz, um doutor das leis mundanas. No segundo grau de antigamente, aquela faixa de escolaridade que antecede o ensino superior, resolveu estudar eletricidade para desespero dos pais. O pai, dizia, aflito para a mãe:
 - Meu Deus, esse menino vai incendiar meio mundo! Imagine ele questionando um polo negativo e um positivo que tem de se unir para gerar eletricidade... Se não for de sua concordância, vai ser curto circuito na certa!
Mas ele parou os estudos por ali mesmo. Encantou-se tanto com os mistérios dos elétrons, prótons e nêutrons formando campos magnéticos invisíveis, porém transformando-se em movimentos, luz e calor visíveis e sentidos que abandonou o sonho da família. Assim como o dito destino tem suas ironias, o predestinado também aprende a dar seus dribles na sina. Era mais uma maneira de mostrar sua autoridade, independência e prazer pela querela. Júdice era seu nome tal e qual era seu modo de viver.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

SEGREDOS NO COMPUTADOR (I)


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 Todos os segredos do mundo estão guardados nos computadores. Já houve um tempo em que eram usados cofres. E para manter ainda mais os segredos, eles ficavam embutidos na parede e atrás daquele quadro com um rosto familiar ou uma obra famosa. Para completar, quem tivesse acesso ao cofre tinha que primeiro saber o segredo para abri-lo e só então, ter acesso ao que estava sigilosamente guardado lá dentro. Costumava ser uma grande herança, títulos de terra, promissórias, jóias de família ou barras de ouro. Ali também eram guardados documentos comprometedores. A prova da paternidade daquele filho, a revelação de algum testamento (sempre tinha mais alguém que os herdeiros não imaginavam e acabava dando confusão após a morte do doador).

Entre os poderosos tinha sempre algum segredo de estado, algo que poderia mudar o destino de muita gente e se algum bisbilhoteiro tivesse acesso, ficava com o poder do bem e do mal.
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O velho colchão que outrora cumpriu esse papel foi rapidamente superado. Qualquer um que fosse arrumar a cama direitinho, numa sacudida esbarrava com a dinheirama ou a papelada secreta e tudo estava perdido. O cofre foi seu sucessor nessa função. Deixaram o colchão apenas para o repouso e outros prazeres, além das mijadas, claro!

Hoje o grande guardião se chama PC. Isso mesmo; esse computador ai onde você está lendo. Ah, teve também o telefone para segredos mais pessoais ou que precisavam ser divididos para dar certo ou para comprometer mais alguém. Mas o grampo tem mostrado que não é confiável combinar trapaças, tramóias e maracutaias e traições por via  telefônica. Só mesmo os incautos continuam  com a teimosia de tramar através de conversas pelo fixo ou celular.

O computador (pelo menos se não cair nas mãos da polícia através de alguma denúncia) é que tem guardados todos os segredos do mundo. Mas não pense que na hora do aperto é só dar um Del e seu arquivo vai para o espaço sem rasto. A mesma onda magnética que o levou para dentro da memória o mantém por ai, em algum lugar que só os especialistas e a Polícia descobrem. Esse invento de última geração é um sucesso, mas funciona como os sinais de fumaça ou as antigas batidas de tambor. Uma vez digitados, cheirados ou ouvidos, estão registrados para sempre. Cuidado!

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A MADRUGADA

BH - imagem google

04: 15 da manhã. Uma música alta, ouço apenas o refrão: “Valeu a pena, Valeu a pena, pescador de ilusão...”

Uma sirene. Resgate? Polícia? Tão comuns as ocorrências que o som já está incorporado ao cotidiano. Faz falta o dia que não tem. É tão estranho estar calmo! Como nos dias de longos feriados, a cidade curiosa e contraditoriamente parece ficar mais humanizada quando tem poucas pessoas. A gentileza e a tolerância parecem confirmar serem sentimentos de poucos. Todo mundo fazendo presenças nos lugares de lazer e numa ternura quase palpável como se tivesse data certa para acontecer. Momentos de ver crianças brincando livres como deveriam ser todo dia, de gente dedicando o ouvido ao outro dando a sensação de que estão de fato prestando a atenção, considerando-o semelhante com todas as possibilidades antropológicas sociais.

Uma cidade que dorme em parcelas. O moço da padaria acaba de passar com sua moto de ruído inconfundível. Daqui a pouco tem pão fresquinho e já estará claro o dia. Fico pensando sobre a vastidão do mundo e a insignificância de cada um isoladamente. Caber no mundo todo mundo cabe. O problema é como cada um se encaixa no seu quinhão de área livre para circular e acontecer humanamente. E o mais intrigante ainda é como cada um acontece. Gente cheia de sonhos, gente que nada sonha. Apenas trafega por lugares mais longínquos ou mesmo ao nosso lado cada um exibindo a sua indiferença e alguns com uma indisfarçável demonstração de desejo de reconhecimento.

E eu aqui tentando escrever sobre algo que contemple esse espírito emocionado. Acho que não precisa, sinto que uma paz estranha assim não encontra eco nas palavras que se apresentam disponíveis para mim. Estou saciado por ora. Idiossincrasias da solidão coletiva.
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