quinta-feira, 20 de março de 2008

RESIGNAÇÃO INDÍGNA

Está para sair ainda este ano, uma nova versão de “1968, O Ano Que Não terminou”, do genial Zuenir Ventura. Quem não viveu naquela época, nem leu a primeira narrativa, poderá fazê-lo, não por necessidade de ofício ou simples prazer literário. Mas com olhos de ser pensante nesses tempos de idéias pré-concebidas sem ressonância, sem resistência agregadora.

Quisera ter eu mais anos em 1968. Nascido já estava, mas de muito pouca idade e tinha liberdade. Não era proibido brincar. O que não se permitia era falar para ser ouvido. A não ser nos porões sombrios das armas. Ali era obrigação Mas aí, uns dez anos após, já na faixa etária que reivindiquei ter tido lá nos 68, estava também naquele resto de luta ainda com fogo, mas, com bem menos fervura. Tomei gosto pela luta, influenciado fortemente pela vida em repúblicas de estudantes e trabalhadores, onde viviam os novos amigos já mais adiantados que eu em anos, leituras e militância.

O mal naqueles tempos não era uma pessoa, um gestor público, um político, um juiz ou um algoz sozinho ou em quadrilha. Era um sistema visível, cuja perversidade todos queriam travar alguma batalha em sentido contrário. Até mesmo a imprensa, que hoje se posta de joelhos venerandos perante a quem lhe extorquiu o direito à letra, palavra e imagem fora de contexto ou de foco.

E vou logo empatando a polêmica(?) com os mais novos. Havia, como hoje, tatuagens, brincos na orelha e muito show de rock. Tudo embalado pelas idéias construídas. Mas nada de idéias que já vêm embaladas para consumo como atualmente. Esse argumento é para aqueles que rivalizam a geração anterior com um anti-saudosismo histórico. Porque tenho saudade das ruas cheias de gritos por mudanças, das mãos erguidas junto com as cabeças contra o silêncio imposto. Das grandes reuniões públicas por eleições diretas, pelo fim das torturas, por greves gerais para a redução das jornadas de trabalho e aumento dos salários, das passeatas estudantis pelo ensino público gratuito e de qualidade, das manifestações nos dias das mulheres contra toda forma de opressão, das queimações simbólicas das personagens abomináveis nos sábados de aleluia. Também sinto falta dos companheiros guerreiros dos carros de som ou das praças com megafones sem watts elétricos, mas com potentes ecos, dos que ainda permanecem na luta, mas a fazem com certa interinidade de gabinete, dos lutadores que abandonaram tudo por sentimento de derrota ou por derrota mesmo, dos companheiros antigos que se tornaram estrelas deslumbradas do poder e dão rédea curta ao contraditório. Faz-me falta eu mesmo transformando aqui tudo em letras mortas, inoperante, inquieto e fraco.

O sangue circulava-me melhor quando os combates eram movidos pelo poder das idéias. Hoje há uma guerra pelas idéias de poder, custe o que custar, doa a quem quiser sentir dor.

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