segunda-feira, 9 de agosto de 2010

ECA!!! *


ESTE ARTIGO É UM ENSAIO SOBRE AS MUDANÇAS PROPOSTAS NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA) QUE ESTÁ COMPLETANDO 20 ANOS DE VIGÊNCIA COM INCLUSÃO DE PENAS PARA PAIS QUE DEREM PALMADAS NOS FILHOS.

Pouco a pouco o estado vai assumindo aquela condição do fantasma do monstro abominável de um passado não muito distante. Representaria o comunismo no seu estágio mais extremista. Ele seria as mãos e os pés dos homens e mulheres para que estes pudessem se dedicar a seu serviço. Um monstro do tamanho de um bairro, de uma cidade, de um estado, de um país.

A ameaça campeava solta pelo imaginário popular disseminada pelo seu inimigo mais temido: o outro lado do maniqueísmo que representava o capitalismo, onde o estado era apenas um agente regulador de pequenas normas de conduta gerais e o resto era a liberdade plena, absoluta. Tanto a liberdade de ir e vir como a de estabelecer meios de se ganhar a vida como cada um achasse melhor. Tanto que os mais radicais desse lado, na sua anti-propaganda diziam que comunistas comiam cabeças de crianças. Não era mais o “vou chamar tutu pra você.” Era vou chamar um comunista pra você, se não se comportar.

O comunismo sequer chegou a ser implantado tal como foi preconizado pelos seus teóricos. Foi uma aventura onde a sede de poder do homem tomou o lugar dos princípios de igualdade ampla geral e irrestrita. Os modelos que o mundo experimentou foram um mal sucedido engessamento das liberdades individuais e uma igualdade onde quem mandava era mais igual do que quem obedecia. Foi tentando se manter a ferro e fogo e não podia dar em outra coisa: a resistência interna nos respectivos países e uma pressão externa que o tornou insustentável. Chegaram a construir muros para tentar isolar-se das tentações do mundo maravilha do capitalismo também desigual, mas onde o homem era livre. Livre pelo menos para poder escolher a qual dono ia se submeter. Lá atrás dos muros era um só dono, o estado totalitário.

Nas suas teorias, Marx** chegou a dizer que a idéia era uma sociedade onde o homem pudesse caçar de manhã, pescar à tarde e fazer crítica literária após o jantar, numa metáfora da suma e perfeita liberdade, das possibilidades de escolhas e da associação do trabalho com o prazer naquilo que não ultrapassasse as necessidades de sobrevivência. Não haveria riqueza extrema nem pobreza absoluta em termos materiais. O prazer viria como consequência, ao final de cada jornada, quando o tempo seria dedicado ao ócio que alimentasse o espírito. Bonito, né? E eu ainda acrescento aqui o que ele esqueceu de dizer: poderia namorar também nas horas livres, afinal, ninguém é de ferro!

Nessa queda de braços, estruturas vão se rompendo na marra. Na contra-propaganda, pelo terror psicológico e em último caso, através da violência. Isso altera significativamente o ritmo da vida de todos e a vida doméstica, principalmente. As relações se pautam no que acontece de fora para dentro e não o contrário. E tudo o que resulta de ruptura drástica, deixa perdido um rastro que seria o guia para o novo e deixa um caminho desconhecido à frente. Acho que os valores tradicionais que tanto foram questionados foram rompidos a pretexto de se criar um novo padrão comportamental e não houve um necessário e saudável debate com a comunidade envolvida. O rompimento é executado por rebeldes e a ordenação pelos “iluminados” ou gente de boa intenção que tenta a todo custo colocar as coisas nos eixos e se vê impotente. Não incapaz, mas impotente por que no meio do caminho há pragmatismos e interesses os mais variados. Os pais ficaram literalmente perdidos diante de tantos direitos sem a contrapartida da autoridade que lhe foi de certa forma subtraída pelo clamor geral de liberdades. Hoje até para um cachorro temos que fazer deferência em público sob pena de sermos execrados como maus. Corrigir um filho rispidamente na rua, é risco de linchamento. Nesse vazio psico-pedagógico, surge a figura do especialista. Hoje há especialista até em unha encravada. Gente que se arvora em aconselhar educação de filhos sem nunca ter tido um elabora manuais que são seguidos até mesmo por causa da falta de tempo dos pais de se dedicarem aos filhos. É, creio, uma forma também de expiação de culpas (seguindo-se o que manda o manual e em concordância com o senso comum está se fazendo o certo). Acho que é nesse vácuo que nascem as leis feito o ECA. De um lado, há abusos, de outro, há incapacidades pedagógicas. O estado num esforço de equilibrar as tensões age. É certo? É errado? Acho que são iniciativas. Ainda vamos passar por uma longa transição (que a meu ver vai deixar seqüelas em toda uma geração), mas é o preço que pagamos por acreditarmos mais nas coisas do que pensarmos nelas. 

O tapa passou a gozar de um status da maior violência que se pode cometer contra uma criança. Acho que há violências piores, sem que se encoste um dedo numa criança. Abandono, fome, chantagem, castigos no escuro, palavras de rejeição, enfim, é realmente polêmico e não quer dizer com isso que eu defenda uns tapas. Também sou contra toda espécie de violência. O que eu acho estranho é o legislador não se preocupar com o tecido social inteiro. Vai fazendo remendos que podem não resultar em uma bela colcha de retalhos. É temerário deixar que o estado tome conta de assumir de forma tão acintosa a educação dos filhos. Pode resultar em frangalhos.
Esta é uma opinião ainda em ebulição.


* O título com exclamação é um trocadilho infame que eu fiz
** Karl Marx, A Ideologia Alemã, ed. 1976, pg. 46.

7 comentários:

chica disse...

Esses teus textos levantam grilos e fazem pensar..Há tanto o que fazer pelas nossas crianças!!! abração,chica e linda semana!

pensandoemfamilia disse...

Bom dia Caca

Texto repleto de análises importantes, um verdadeiro alerta sobre nossa participação como sociedade e o "poderio" do Estado.
Em cada momento históricos assistimos propostas de igualitarismo, cada uma com sua vertente, mas que na prática não se concretizam.
bjs,

lis disse...

Cacá , já na leitura do primeiro parágrafo fico "sensiblizada" com uma proposta tão criativa!! aí o seu ECA com as exclamaçoes é pouco e faz-me rir!!
acho tudo da maior incopetência ,milhares são as crianças precisam do amparo efetivo de Estado e de uma política de educação eficaz que combata o analfabetismo e/ou que conduza os pais a atividades capazes de melhorar seu nível de estresse da falta do essencial em suas vidas e nao essa preocupação com a tal palmada que sempre foi tão benvinda quando bem aplicadinha rsrs nossos avós que o digam !claro que também nao sou a favor de violencia doméstica e se a palmadinha for regra já nao servirá pra nada ,e realmente tornará inadequada.Mas fazer disso discussao dos engravatados é mais falta do que fazer...sou contra perder tempo com palmadinhas de maes sem que se resolva a razao da real violencia que é exatamente o que voce cita o abandono, a fome e a miséria extrema dessa gente.
Sei lá, quem sou eu pra entender disso, falo como mãe e observadora de causas e efeitos, do nosso dia a dia.
Bom texto Cacá , oportuno
abraços boa semanascit

Anônimo disse...

Cacá,
Adorei o trocadilho no título, eu também faço o mesmo, mentalmente, sempre que pronuncio essa sigla horrorosa. (Lembra do Mad?, hehe).

Pra início de conversa, o Estado meteu sua colher em assunto que não é da sua alçada e saiu esse Estatuto capenga, que, ao longo de sua trajetória, tem causado desgastes e apreensões gratuitas, tanto nas familias, quanto nas escolas. E do ponto de vista prático, vivencial, não melhorou em nada a vida daquelas crianças e adolescentes que verdadeiramente são alvos de injustiças por parte dos adultos. Não mesmo.

Noto, isso sim, um prejuízo social crescente, fruto das apreensões a que me referi antes, e que ainda persistem, pois passaram-se tantos anos e os pais e professores ainda não conseguiram apropriar-se de alguns conceitos jurídicos elementares existentes no Estatuto, e esse desconhecimento os torna reféns do mencionado diploma legal. Uma pena.

E agora vem novamente o Estado-Senhor, com inesperado e, no meu pensar, desnecessário acréscimo ao artigo 18, a tal Lei da Palmada! É de lascar.

Minha posição a respeito, você já conhece, está expressa no post que escrevi quando tratei da matéria.

Gostei muito de sua reflexão sobre essa reviravolta jurídico-social imposta por "especialistas", (de todas as áreas, diga-se de passagem). Mas tu sabes que agora estou achando que isso também se presta a um cabide de empregos? Sei lá. Cala-te boca, hehe.

Parabéns pelo texto e pela clareza dos argumentos, que nos convidam a refletir com mais profundidade sobre o assunto.
Bjsssss

Mariana disse...

Cacá teus textos tem a lucidez q falta no meio político.
Zelar,amar e respeitar, além d ensinar nossas crianças é necessário, mas mts não acham isto importante.

Celina disse...

Oi Cacá, boa tarde, alguem que sair de heroi nestas benditas palmadas. como se educasem as nossas criancas só com palmadas , na educação é preciso mais, a força moral atravez do ezemplo, escolas bem equipadas bons mestre, dificil de encontralos ganhando uma miséria,é uma série de males e ainda crialos evangelizados, não fanáticos,sabendo respeitar o próximo. Ah é muita coisa, o meu avó dizia eu bato para mais tarde evitar que a policia o faça.paz celina.

Hugo de Oliveira disse...

Bem pertinente o seu texto...gostei. O interessante seria o ECA ser mais respeitado e executado, coisa que não é;

abraços

Hugo

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