sábado, 24 de setembro de 2011

TERAPIA


“O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem. (Guimarães Rosa)




De que são feitos os meus momentos de felicidade, uma vez que é impossível ela ser plena e inacabável? Como vou construindo e elevando a minha auto-estima? 

Não há coisa melhor do que um esforço recompensado de fora para dentro. Eu acho que a gente tem uma característica atávica de procurar caminhos mais fáceis pra tudo. É muito legítimo e evolutivo do ponto de vista humano mas há umas coisas que são mais  edificantes quando impomos a nós mesmos um sacrifício em termos da satisfação comemorada ao final. De que adianta eu arranjar quem faça tudo por mim ou pagar por tudo ou conseguir tudo na base da esperteza se depois eu vou me sentir o pior do mundo? Não valorizando as minhas capacidades, com todo dinheiro de que eu dispuser para comprar facilidades vou me sentir um inútil. Vou acabar achando que todos serão sempre melhores do que eu. Então se faço um sacrifício para ver meu esforço dando um resultado (mesmo que ele seja só para mim), já estou pago e muito bem pago.



Hoje em dia, temos personal disso, personal daquilo (nada contra esses profissionais nem contra quem faz uso de seus serviços) mas comigo seria uma sensação de inutilidade. Ouvi numa reportagem que já existe um personal conquista. As pessoas estão indo para as baladas, para o happy hour ou seja lá onde haja uma possibilidade de conquistar um par e ficam o tempo inteiro olhando para as redes sociais nos celulares ou falando neles e sequer tem tempo de ver à sua volta para relacionarem-se com os presentes, daí surgiu o vácuo preenchido por quem promete dar conta de lhe arranjar algum par, sem que se tenha que fazer muito esforço pessoal, além de se portar educadamente e ficar esbanjando uma cara de disponível nos lugares onde vai. Achei um horror, com todo o respeito com quem ganha dinheiro se prestando a esse papel e com quem se dispõe a pagar.



Pois, bem, essa lengalenga toda é pra falar de minha auto recompensa mais recente. Uma coisica de nada, como diz o meu amigo Joaquim. Sendo a cozinha e a literatura minhas terapias diárias, aproveitei uma reunião de família para testar um aprendizado. Fiz o teste na minha casa antes e depois fui apresentar para os meus comensais. Aprendi a desossar um frango inteiro, rechear com algum complemento gostoso e depois assá-lo. Minha nossa, que pequeno sacrifício que valeu a pena para mim! Mesmo se as pessoas não tivessem achado gostoso eu já estaria realizado, foi o resultado de meu investimento em paciência, determinação e, especialmente prazer em fazer algo que gosto. É recompensa  impagável com qualquer outro valor que não seja satisfação interior. Faz bem para a minha alma, me demove da sensação de inutilidade, me transforma em potentado de pequenas potencialidades, me joga para o alto em minha circunstância daqueles momentos de felicidade mais íntimos, incompreensíveis e indestrutíveis.

23 comentários:

chica disse...

E tem gente que não acha motivos pra ser feliz... E eles estão nessas pequenas coisas.

Valeu e deve ter ficado boa essa galinha! abração,chica

Pedrita disse...

eu tb gosto de experimentar na cozinha e igualmente fui experimentando primeiro com os mais próximos. eu tenho o péssimo hábito de fazer muita coisa sozinha e acho q delegar um pouco sobrecarrega menos. mas concordo q delegar tudo perde a graça. beijos, pedrita

Celina disse...

Oi Cacá, que crõnica maravilhosa, vc dá uma lição de vida, quantos seguisem o seu exemplo´ não teria tanto que reclamar, só ver a sua vitoria nos sentimos alegres tambem. Um abraço Celina

Aleatoriamente disse...

Os meus da alegria do outro, das possibilidades alcançadas, de um gesto de carinho.
Do nascer do sol, do brilho das estrelas, de me saber filha de Deus.

Minha auto-estima?
Está comigo desde cedo e todos os dias trabalho nela.
Gosto de lutar em prol daquilo que me deixa feliz, que realiza minha vontade de um mundo melhor, com amor, paz, e delicadezas.

Acho que a maioria vive de “se”, e devemos com certeza ter mais coragem de saltar obstáculos, se for para melhorar
Coisas que nos travam a vontade de prosseguir e nos deixa numa debilidade devem ser excluída com certeza.

A felicidade é cada momento que respiramos, nos movemos, sorrimos, abraçamos, amamos.
É tão simples porque já temos a ferramenta, tudo de graça.
Amei teu texto e Guimarães onde estiver com certeza, também amou.

Cacá meu amigo querido, um bom dia para ti e feliz primavera.

Beijinho



Cacá meu amigo querido, um bom dia
para ti e feliz primavera.

Elayne Aguiar disse...

Sacrifício ou prazer? O prazer por si só não traz sacrifício, mas todo sacrifício tem como bem maior ao final o prazer...(Ôpa, mais uma pra minha compilação)Já parou para pensar nisso?
Quanto ao que escreveste sobre futilidades e afins concordo plenamente. Tudo o que você coloca aí é verdade, mas sabe, esse é o preço de quem vive hoje, século XXl, ano 2011. Penso muitas vezes que entre mortos e feridos estamos cá, nós, reles mortais, escrevendo, trabalhando, amando, sofrendo, fazendo o que a gente gosta ou quem sabe morrendo...isso não é uma dádiva? Muitos se doaram por inteiro e tanto almejaram em viver, mas não alcançaram: este século de tantas possibilidades. Não que eu me sinta Alice no país das maravilhas. Tenho consciência das mazelas e toda futilidade que existe no mundo e nas pessoas, mas é tão bom nos sentirmos vivos e ver o tempo passar e novas coisas surgirem...Como se diz:é ver para crer...E como eu costumo dizer: adoro falar minha idade: Vou fazer 37 e agradeço a Deus porque não morri aos 15, aos 25, aos 30...Terei orgulho de dizer sempre...

Bjos Cacá! E um doce e fraterno abraço!

lis disse...

Oi Cacá
Um texto que eleva nossa auto estima tão pra baixo algumas vezes.
Tantas imperfeições que descobrimos a cada instante dos nossos dias, do tempo que passa , dos desejos que não realizamos vida afora! e voce nos mostra com simplicidade e leveza como podemos ser felizes desossando uma galinha hehehehe Adorei.
Um texto pra reler e reler .
Preciso de uma terapia Cacá talvez não seja próximo a cozinha , mas aprendi uma lição - as pequenas alegrias são nossas melhores conquistas.
um bom sábado de primavera.

MA FERREIRA disse...

Cacá..amei sua crônica!!!

Sabe o que acho? Somos preguiçosos.
Podemos nos permitir a fazer tanta coisa....
Eu sempre me achei inabilitada para certas coisas...
Logo que casei..eu comprava panquecas prontas e dizia que eu que tinha feito..rsrs
Achava que dava muito trabalho..depois lvar liquidificador..etc..

Um dia resolvi faze-las..Vi que era tão simples... e o prazer de ter conseguido ultrapassava a sugeira ( que nem era tanta ) feita..

Eu tb achava que ( como fui vendedora de automoveis 17 anos )., nao sabia fazer outra coisa..

Ate que um dia me deparei com a ceramica..

As vezes desconhecemos o nosso potencial...por nao acreditar na nossa capacidade e muitas vezes por preguiça mesmo...

Um bom final de semana a vc..

Denise disse...

O que mais me encanta depois deles mesmos, é a discussão que teus textos deliciosos provocam, Cacá.

A gente se move por que acredita no que aliciou nossos comportamentos, e os repete se o resultado é bom - queremos de volta todas as sensações experimentadas. É fazendo e sendo que descobrimos nossos potenciais, e a tendência é que a confiança gerada pelo autoconhecimento nos dê mais coragem para experimentar, e isso é uma bola de neve, que junto aumenta o bem-estar, eleva a auto-estima enquanto esse processo torna a gente pessoas mais felizes.
Somos capazes de preencher nossos vazios, basta encará-los para compreender as faltas e transformá-las em combustível pra viver...tudo isso tb é evolução, concorda?

Vc faz bem, grata pela paz também!
Bjos

Maria Rodrigues disse...

Querido amigo a felicidade está nas pequenas grandes coisas que a vida nos vai oferecendo e nas vitórias pessoais que vamos alcançando, e nos fazem sentir que "somos capazes".
Aproveite ao máximo o fim de semana.
"Hoje é o primeiro dia do resto de nossas vidas." (Charles Dederich)
Beijinhos
Maria

Kunti/Elza Ghetti Zerbatto disse...

Bom dia Cacá!
Concordo contigo nada como a gente mesmo fazer as coisas e consegui-las com nossas batalhas e lutas.
Tem um sabor diferente mesmo.
Também prefiro ir devagar e sempre, caminhando passo-a-passo.
Um excelente fim de semana para ti.
abração com carinho

Maria Emilia Xavier disse...

Vir aqui é sempre um refrigério para a alma, para a cabeça, enfim é muito bom. Precisava mesmo refletir sobre este aspecto. Eu consigo e faço tanta coisa que me agrada porque essa história do meu "dedinho" não arrefece e me deixa menos ou nada idignada? Acho que é o momento que atravesso, cheia de "pena" de mim", só e triste... Onde foi que você conseguiu aprender a desossar o tal do frango? Se foi na Net, me passa o endereço? Vem aí,dia dois, o aniversário do João Vitor e é uma ótima oportunidade para mostrar a esses "carnívoros" aqui de casa, sem dó do póximo, uma coisa diferente.

Silvia Cristina disse...

Oi Cacá,

Meus motivos, vamos lá:
Ver um sorriso estampado no rosto de meu filho, por qualquer carinho, seja ele uma mamadeira bem doce, um abraço que afaga, uma cosquinha, um beijo demorado e estalado... Ouvir ele, nossa, como criança precisa ser ouvida...
Acarinhar também minha mãe, não fisicamente, mas trazendo uma xícara de café sem ela pedir, e ver um sorrisão que diz: Você adivinhou o que eu queria!
Preparar um bolo rápido e coberto de chocolate, para filho mãe e irmão que adoram e se lambuzam (gosto também)
Quando meu pai era vivo, felicidade era "entender" o que ele queria dizer, dar aquele banho nele, deixar cabelo cheirando a shampoo e a pele a creme. Rir com ele, fazê-lo rir, coisa que era rara, mas o sorriso era lindo. Ver ele querendo disfarçar a risada e o balançar do ombro o entregar.

Felicidade mesmo era ver minha mãe quase entrando em desespero com as contas vencendo e o dinheiro faltando e dar meu jeito: vendendo o que sei fazer, ou o que ela sabe fazer, e darmos a volta por cima.

Sim, temos muito mais razões, simples razões para ser feliz, e nos sentir útil, amado, demonstrar nosso amor, não tem preço...

(Li seu texto que me indicou no comentário em meu blog, tentei comentar, mas meu filho me chamou exatamente naquele momento. Volto e comento com calma.)

Beijosssssssssssss

Sabor de Pitanga disse...

"Desossar um frango inteiro"? Confesso que nem sabia da possibilidade!!!

Como voce, tenho tammbém PAIXAO pela cozinha. Adoro fazer experiencias e fico muito feliz quando dá certo. Agora desossar um frango, nao creio que me seja possivel...

Quantas horas voce necessitou para tal proeza?

Bom domingo para você.

Meire Oliveira disse...

Cacá querido, adoro essa citação do Guimarães Rosa! É muito verdadeira e tudo o que escreveu assino em baixo. É maravilhoso poder conquistar, conseguir fazer algo que nos empenhamos tanto, que realmente trabalhamos para conseguir.
Lendo a sua conquista me lembrei do filme "Julie & Julia", vc já viu? É com a maravilinda Meryl Streep, acho que se num viu ia adorar!!! :)
bjokitas com imenso carinho.

Casal 20 disse...

Ai Cacá, que legal!

Olha, um dia, os índios nos ensinaram a preparar um jabuti e um tracajá das águas dos Amazonas. Uma delícia! Mas é um trabalho terrível para abrir o jabuti. Tivemos que abrir com um machado!!!

Já o tracajá, a gente só coloca o bichinho de cabeça para baixo e em cima do fogo. Tadinho. Ele fica lá, balançando as perninhas até morrer.

Amei o post e a alegria que dá essas coisas simples.

Abraços sempre afetuosos.

LUCONI MARCIA MARIA disse...

Querido amigo eu adorei isto, sabe eu já tentei desossar um frango sozinha, para rechear, mas olha coitado do frango, eu sou assim quero fazer algo me meto a fazer sem ir aprender, mas você tem razão é uma delicia a sensação de ter conseguido vencer algo, realizar algo, mesmo que os outros não vejam, o importante é nós sabermos, beijos e lindo domingo pra ti Luconi

Jorge Sader Filho disse...

São estas aparentes pequenas coisas que dão graça ao existir.
Um prato bem feito, o uso das ervas apropriado, o cuidado com plantas ou animais, a escolha é grande.
Por fim, a dura e difícil arte de escrever.

Abraço. Jorge

Tais Luso de Carvalho disse...

Cacá, eu percebi há muito tempo que esta juventude atual pensa que está se comunicando, interagindo ficando horas nestes aparelhos, com mensagens instantâneas e perdem o sentido real das coisas. Não que não os faça, mas não com tanta intensidade e em quase tempo integral. Penso que isso dificulta a verdadeira sociabilidade.

Outra:quando precisamos da ajuda dos outros para tudo, algo vai errado. Nada contra, mas encontrar nossos caminhos é bem melhor do que seguir o caminho dos outros.

O que nos dá prazer, é encontrar motivações nas pequenas coisas, a vida do dia a dia. O resto é bom, mas temos de cuidar para não vivermos de fantasia.

Um beijo, amigo.
Tais Luso

Mariazita disse...

Boa tarde, Cacá
Comungo a ideia de que tudo o que é mais difícil de alcançar é o que nos dá maior satisfação depois de conseguido.
Ter personal para tudo deve ser um pouco menótono :)
Eu não me importaria de ter um "personal trainer" que me tirasse uns quilitos que tenho a mais sem me dar grande trabalho :))) Mas mais do que isso, não, obrigada!

A descrição desse frango desossado fez me crecer água na boca.
Imagino a delícia... nham, nham...
P´ra próxima quero ser convidada :)

Bom domingo e feliz semana. Beijinhos

pensandoemfamilia disse...

Esta sua crônica aborda pontos fundamentais desta nossa era, a busca da felicilidade sem um real contato íntimo consigo e com o entorno. Daí tantos profissionais, até mesmo para encontrar o "par perfeito'. A paixão é a mola propulsora; entregar-se intensamente ao que faz, com gosto, nos proporciona resultados de contentamento indescritívéis.
bjs

Anônimo disse...

Cacá. Impressionante, observar a partir da sua escrita seu estilo exigente, educado, despojado, rico e pleno de poesia. Se eu dissesse sobre a minha admiração por estes ajustes de sua personalidade, ficaria muito repetitivo. Porém, hoje não pude abster-me de tal afirmação. Você, uma vez mais, tem razão. Para mim a literatura também é terapia. Abraços!

Eva disse...

Cacá como te entendo, eu aprendi a desossar um frango com minha avó,e como fiquei feliz, outra coisa que aprendi foi assoviar com meu pai, não chego ao rouxinol que ele era, mas sai um assoviozinho, tinha muita dificuldade, concordo com você, não tem coisa melhor que nos entendermos capazes de tal proeza, vamos dizer assim, nos desafiando, chegamos lá, a um bom conceito de nós mesmos, prá mim isso é ser feliz. beijos, adorei o texto, como sempre, você é o máximo, na minha opinião.

Toninho disse...

Legal Zé, esta busca é maravilhosa,mas poucos se sensibilizam para esta riqueza que alimenta a alma e o ego.Outro dia fiz algo semelhante,que era extrair o filé de tilápia,rsrs.Foi um desastre a primeira mas vou tomando jeito.
O pronto está invandindo as pessoas como o Google.
Bom apetite amigo.
Um abração e boa semana.

Ps. estou vendo estarrecido este incendio na serra.

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