quarta-feira, 21 de maio de 2008

A BANDA E EU

Quando a banda de ofício era o compasso das cidades, as festas e acontecimentos importantes eram regidos e saudados por elas. De longe se sentia o som do bumbo, do prato e dos inconfundíveis sopros dos pistons e clarinetas, que levavam às portas e janelas os olhares com encanto mágico, dos pequenos, médios, grandes e velhos, senhores e senhoras, meninos e meninas, casais e namorados. E eu desejando estar no lado oposto. Queria as baquetas do tarol ou a vareta do bumbo enrolada nas mãos e batendo num som bonito, perfilado, com uniforme passado a vinco, mas tinha vergonha do destaque ou medo do fracasso.

Depois de passados anos até que se possa pensar no que foi feito da vida e dos desejos não realizados dá para perceber com muita certeza o quanto é bom se viver e aprender as coisas sem repressão e opressão. A autoconfiança, estima elevada e destemor do novo são alavancas da criação. Não movem o mundo mas deixam-no menos doído e mais belo. Dá até vontade de viver longamente na esperança que esse mundo aconteça de verdade.

Tinha em criança um ouvido que batia, batia, batia já com ritmo que parece ter nascido comigo dos tambores dos ancestrais ou das músicas das ruas, das rádios e das festas. Só sei que batia sempre em meu ouvido. E deu um gosto pela percussão que eu usava lata, tampo de mesa, caixa de fósforos e tudo que chacoalhasse em som de bateria. Menos os instrumentos de verdade que eu amava, surdo, tarol, xiquexique, reco-reco, zabumba, cuíca e pandeiro mas que me metiam medo.

Entre tantas frustrações, que eu julgava serem frutos da timidez, descobri que se tratava simplesmente de medo de fazer bonito a acharem feio. Medo de destacar e ser taxado de aparecido, esnobe. Medo de o auge ser vizinho do abismo. Acreditava que já tinha um destino traçado por uma força superior ou por uma ordem superior, seja dos pais, da escola, ou uma ordem natural dos caminhos retos que levariam todos a algum lugar. Por isso eu só vi a banda passar.

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