sábado, 30 de agosto de 2008

CASAMENTO DE MAÍRA

Meu espanto é do mesmo tamanho do sonho. Parece que foi ontem. O tempo vai passando sem pedir desculpa nem licença e sem esperar por ninguém. As pessoas é que sempre esperam ou adiam ou atrasam a vida. A minha primeira filha já vai se casar. Ao nascer tinha só oito meses de preparo e um quilo e duzentos e cinqüenta gramas de gente, mas toneladas vontade para viver a sua sina. Passou infância rápida, viveu tumultos nem tanto. Doenças, só as de costume em criança ou de algum descuido dos pais. Cresceu pra lá e prá cá, muda de casa, de escola, de cidade; de pequena com o pai, o restante com a mãe. Nem viu a adolescência ser arrastada depressa junto com o resquício de infância, rumo à responsabilidade que veio porque a vida precisou. Soube conservar, porém, a juventude na alma, na face e deixou só a mente crescer e o coração se encher de amor de casamento.

Vai filha, e semeie esse broto de família que agora é seu. Dê-lhe ar puro, atenção e carinho sem parar, que ele vai ganhando sustância até espocar, até não caber de tanta alegria. Faça da sua mente a casa do mundo e do coração a base para uma moradia suave, terna e inexpugnável, na companhia da felicidade.

domingo, 24 de agosto de 2008

LABIRINTO DO AMOR

Gilse amava Zezinho, que amava Elaine. Doidinhas as duas. A primeira de amor; já a segunda de tanto levar socos do pai que odiava Zezinho, que namorava as duas. Escondia a Gilse da Elaine e escondia a Elaine do pai. A primeira via todo dia; já a segunda só na furtiva ou pelas cartas escorrendo amor pela tinta. E quem escrevia era o Paulo, o poeta que inventava o amor de papel para o amigo. Gilse deixou o amor de lado e casou com outro rapaz. Elaine perdeu a guerra com o pai e largou o amor de Zezinho, que perdeu o jeito de amar, casou com outra moça e foi para Carajás.

sábado, 9 de agosto de 2008

RIGHT SOCIETY

A coluna social é o espelho que revela a alma translúcida da sociedade – a alta. Olha-se de frente e se enxerga do outro lado sem ter nada que preencha o meio com algum tutano. Mas as cabeças em si são lindas. Os cabelos esticados ou assentados, a face irrepreensível e imexível para não estragar a pintura e as fotos saírem bonitas. O sorriso parece que ganha um fixador para ficar permanente como ficam os cabelos para sempre ou mais com esses recursos. Os assuntos - ou babados, melhor dizendo, são de dar náusea em qualquer um que costuma gastar seu precioso tempo com pensamentos e reflexões que desçam um degrau abaixo da superfície lisa e rasteira daquela visão do mundo vasto como um curral de animais de belas raças criadas em confinamento.

Desligados os flashes o barraco vai abaixo.

domingo, 3 de agosto de 2008

CULINÁRIAS HILÁRIAS - O FRANGO

Augusto Bule era colega de trabalho e companheiro de diretoria do sindicato do qual fiz parte. Bastante exagerado em gestos e falas, dava sempre a impressão de querer ganhar no grito todas as conversas e situações. Tratava a quase tudo como se fosse disputa. Uma espécie de transferência do pendor sindical para a vida particular. Quando bebia então, a impressão é que a razão crescia-lhe em proporção geométrica, acima de qualquer argumento. Muito generoso e um grande menino. Acima de tudo, muito solidário e sempre de peito aberto à frente de qualquer injustiça que julgava por seus critérios de bondade. Brigava antes de ouvir e depois, se convencido da impulsividade dizia sempre: Ah, bom...

Havíamos saído de uma rodada de bar e mesmo já tendo petiscado bastante e bebericado idem, resolveu desafiar-se a preparar um delicioso frango em sua casa convidando a todos nós. Recusamos pelo adiantado da hora, cada qual com seus compromissos e descrentes de que pudesse sair algo degustável com ele naquele estado.

Comprou, na verdade um peru congelado, desses que já vêm temperados e com um apito que avisa quando já está apto a ser comido.

O assunto caiu no esquecimento até o próximo dia de encontro de bar em fim de tarde. Perguntado o que havia preparado naquela noite, após muito custo, que não se sabe se por amnésia ou embaraço pela trapalhada, acabou confessando. Havia colocado o bicho numa panela de pressão sem sequer retirar a embalagem e ficou lá aguardando o apito final que o redimiria da sua fome. Até sentir um desagradável cheiro de plástico queimado e deparar com o peru todo enrugado e com o apito afogado depois de abrir a panela.

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